
Dálias
Aziraphale estava atrasada. Era óbvio que ela estava atrasada. Ninguém a avisou que tentar terminar A Divina Comédia numa manhã não daria certo, mas ela era profissional em tentar mexer com o destino.
Era seu primeiro dia de aula na faculdade e mesmo com o título tão esperado ela não conseguiu chegar no horário. Ela estava completamente desgastada quando chegou ao local, de toda correria e esforço. Aziraphale tinha costume de ser pontual, — quando não tinha nenhum livro envolvido.
Quando a loira chegou à porta e a abriu esperou receber algum tipo de reação de raiva ou desdenho, mas, ao abrir percebeu que nenhuma pessoa sequer a olhou. Ela nunca reclamaria desse sentimento de invisibilidade, o que ela menos queria era chamar atenção. Silenciosamente, a mulher sentou-se na última cadeira da sala. A matéria que estava sendo passada era literatura antiga, então, Aziraphale logo pegou seu caderno e começou a anotar.
Quando o relógio mostrou o horário em que a aula acabava, a loira recolheu seu material, o guardou por inteiro em sua bolsa carteiro e saiu da sala imediatamente. Ela precisava saber qual era sua próxima matéria. Ela não sabia a quem perguntar. Rapidamente Aziraphale avistou uma mulher loira com um lenço na cabeça e assumiu ser uma pessoa de bom coração. “Olá, eu estou um pouco perdida. Primeiro dia” Ela deu uma risada boba e olhou para a garota com uma feição culpada, “Eu precisava saber das próximas matérias do curso de literatura, você poderia me informar onde eu consigo essas informações…?” Aziraphale esperou a garota completar a frase com seu nome. “Maggie.” Ela sorriu e Aziraphale soube naquele momento que havia escolhido a pessoa certa para perguntar. “Eu acredito que sua próxima matéria seja música, eu faço essa também! Podemor ir juntas se você quiser...?” A mulher olhou com uma feição esperançosa para a outra, parece que ela não tinha muitos amigos. Mas Aziraphale também não tinha. Quem ela poderia culpar? “Aziraphale.” Ela estendeu a mão. “E eu adoraria.” Ela sorriu
No caminho para a sala de aula, no canto do olho de Aziraphale, por um segundo, ela pôde jurar que viu alguém. Alguém importante. Alguém inesquecível. Mas não poderia ser possível, depois de dez anos ela aparecer assim, do nada. Seu olhar rapidamente se virou para o canto onde uma certa ruiva — supostamente—apareceu, mas a única coisa que ela viu foram armários. Seu olhar voltou para o caminho que estava seguindo, mas sua mente deixou-se navegar, nos dias em que as plantas eram mais cheirosas e sentir era mais fácil.
“Azi!!” Uma criança de cabelos curtos e vermelhos vinha correndo de uma forma desengonçada até a outra. “Olha o que eu achei!” Ela tira as mãos escondidas de trás das costas e as abre, revelando uma linda borboleta azul, pousada em seus dedos. “Ela me lembra você.” A garota loira olha para a borboleta e olha para a outra criança. “Você acha que eu sou uma borboleta?” A ruiva dá uma risada e cora “Eu achei ela bonita.”
“E o que você achou daquela professora?” A mais alta perguntou. “Bom, achei ela um pouco rude com os alunos, não precisava ter respondido aquele pobre menino daquele jeito.” Maggie soltou uma risada. “Ela sempre foi assim, nunca espere algo de professoras que gostam de tomar cereal na aula” Aziraphale olhou para Maggie com um olhar confuso. “Não entendo como isso poderia influenciar nessa de-“ E ao tentar terminar sua frase a mais baixa avista novamente um cabelo cor de sangue passando pelos corredores e se vira rapidamente para não o perder desta vez, mas foi tarde demais. De novo. “O que aconteceu Aziraphale?” Ela voltou para olhar para Maggie com o cenho franzido. “Nada. Eu só pensei ter visto alguém.” E só por curiosidade, ela olhou novamente para o lado, para ter certeza que nenhuma garota ruiva estava lá.
No final da tarde, quando Aziraphale já estava em seu pequeno apartamento, com tudo pronto para dormir, a mulher não conseguia desligar sua cabeça. Oito anos. Fazia muito tempo desde que Aziraphale viu a ruiva. Mas não podia ser, ela com certeza estaria fazendo algo mais interessante, mais perigoso e emocionante, ela não era como Aziraphale. Ah, como ela sentia saudades dela, com certeza a garota nem se lembrava mais da loira, mas a memória dela sempre estaria guardada na mente de Aziraphale, aqueles olhos amarelados cheios de vida, o jeito que ela sempre defendia a mais nova, nunca a deixava de lado ou fazia ela se sentir sozinha. Aziraphale nunca foi tão grata, até que…Ela foi embora. Não foi escolha da loira, é claro, seus pais tinham recebido uma nova proposta de emprego muito boa, ela tinha 10 anos, não teria como ter uma opinião válida nessa questão. Mas foi assim que acabou. O cheiro de grama molhada sempre a lembraria da garota ruiva que nunca deixou suas memórias.
“Aziraphale, você se casaria comigo?” As duas crianças olhavam o céu estrelado, um dia antes da loira deixar a cidadezinha.
Aziraphale abaixou seu olhar e observou a ruiva, sem reação. “Casar? A gente é criança.” Ela deu uma risada como quem quisesse fugir da pergunta. “Eu sei. Eu espero a gente crescer..”
A ruiva abaixou seu olhar para fixar nos olhos azuis que brilhavam mais que qualquer estrela.
Seu cabelo já estava mais comprido. Depois que Aziraphale viu o quão mal a outra garota ficava por ser mal compreendida pela cidadezinha, ela sempre ajudou a ruiva a cuidar mais do seu cabelo, para ele crescer rápido e forte.
“Eu quero te encontrar de novo. Promete que a gente vai se casar quando nos encontrarmos de novo?” Aziraphale tremeu, estava com medo de sua própria resposta.
“A gente só casa com quem a gente ama.” Novamente fugindo da questão, ela também fugiu do olhar penetrante da outra garota, mas quando percebeu que ela ficou em silêncio, voltou devagar a observa-la, percebeu que nem por um segundo os olhos amarelos deixaram de fita-la.
Sentiu uma mão gelada encostando na sua, mas isso não a fez desviar o olhar, ao invés disso, só o intensificou.
“Eu sei.”