
No Departamento Científico
Kawaki acordou suado e ofegante deitado em uma cama do laboratório. Ele tinha alguns eletrodos no peito e outros na cabeça, um medidor de pressão arterial no braço direito e um oxímetro no dedo indicador da mão esquerda. Era um dia de check-up no Departamento Científico, no qual ele precisava fazer alguns testes mais profundos que demoravam mais que o normal e o deixavam entediado e sonolento. A primeira coisa que Kawaki viu foi uma garota de cabelos roxos olhando para ele:
_Como você está se sentindo, Kawaki-kun?_ Sumire perguntou com um olhar doce de preocupação.
Kawaki limpou a garganta enquanto levantava o corpo para se sentar na cama:
_Estou bem, não precisa se preocupar._Ele tentava difarçar, depois de ter tido um pesadelo.
Então Kawaki percebeu que os dedos da sua mão direita estavam entrelaçados com os dedos da mão esquerda de Sumire. Kawaki ficou boqueiaberto ao ver suas mãos dadas e depois franziu o cenho e olhou para o rosto de Sumire. Sumire viu seu olhar confuso e começou a falar como se estivesse dando uma explicação:
_Você parecia estar com dor enquanto dormia, sua pressão arterial e batimentos cardíacos estavam oscilando e aumentando muito enquanto os músculos do seu corpo estavam se contraindo, então...
Amado, que estava sentado em uma cadeira na mesma sala, interrompeu a fala de Sumire:
_Eu estava quase pensando que você estava tendo uma convulsão, apesar do eletroencefalograma estar normal. Eu ia te dar um diazepam intravenoso, mas a Sumire interferiu tendo a "brilhante ideia" de segurar sua mão para "acalmá-lo"._Amado falou soando irônico.
Kawaki e Sumire olhavam com uma expressão séria para Amado enquanto ele falava.
_Funcionou!_Disse Amado com um sorriso intecionalmente falso_Parece que é uma vantagem ter uma enfermeira carinhosa._ falou provocante.
Por conta da fala de Amado Kawaki e Sumire se entreolharam constrangidos, soltando as mãos de imediato. Sumire ficou com as típicas bochechas rosadas, enquanto Kawaki julgava ter escondido seu embaraço ao virar o rosto para o lado oposto, cortando contado visual. Amado observou a cena com enfado, pois considerava previsível a reação dos jovens à sua provocação.
Sumire se recompôs e disse olhando para Kawaki:
_Então, creio que você já está se sentindo bem, certo? Eu vou começar a tirar os aparelhos e terminaremos por hoje.
Kawaki assentiu com a cabeça olhando para Sumire com o canto dos olhos. Seria bem mais agradável se ele pudesse estar com ela sem a presença de Amado os cerceando.
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Depois de retirar o esfigmomanômetro e oxímetro, Sumire passou a retirar os eletrodos do eletroencefalograma da testa e cabeça de Kawaki, o que implicava que ela precisava sujar as mãos do gel que era aplicado para a melhor condução e deixava o cabelo de Kawaki "melecado". O que facilitava era que o local de aplicação dos eletrodos era justamente na área em que o cabelo de Kawaki era bem curto. Quando terminou de tirar os eletrodos, Sumire pegou tolhas de papel na intenção tirar o excesso do gel do cabelo de Kawaki que a impediu um tanto jocoso:
_Ei, precisa disso não, vai ficar até limpando meu cabelo agora?
Sumire arregalou ligeiramente os olhos e disse:
_Você quer limpar você mesmo, então?
Kawaki estalou a língua:
_Larga mão, um pouco de gel não faz mal.
Sumire torceu as sobrancelhas:
_Bem, é que da última vez você ficou reclamando que seu cabelo ficou "lambrecado" na hora que você foi embora depois do checkup, então hoje eu lembrei de pegar o papel toalha.
Kawaki arqueou a sobrancelha esquerda:
_Tá, dá logo isso aí.
Kawaki então pegou algumas folhas do papel toalha da mão de Sumire e as passou no cabelo de forma meio atrapalhada.
Sumire observou o que Kawaki estava fazendo e disse desacreditada:
_Kawaki-kun, você está espalhando mais do que limpando!
Kawaki retrucou mau-humorado:
_Aff, esse papel é uma porcaria mesmo._ jogou as folhas de papel sobre a cama e cruzou os braços.
Sumire suspirou desejando que Kawaki não se irritasse com tanta facilidade.
Kawaki continuou falando com um tom frio enquanto se despia de sua camiseta regata:
_Só tira esses troços do meu peito que eu já estou sem paciência.
Ele se referia aos eletrodos do eletrocardiograma.
Amado, ainda sentado na cadeira olhando para a tela do computador, disse:
_Você não devia maltratar sua enfermeira, hein, Kawaki. Uma hora ela não vai mais tolerar suas grosserias.
Kawaki revirou os olhos:
_Ela pode ir embora no dia que enjoar da minha cara.
Amado então virou o corpo na direção de Kawaki e replicou austero:
_Pois ela não vai embora de jeito nenhum, já te falei que eu estaria num mar de problemas sem a assistência dela.
Kawaki estalou a língua e respondeu sem se intimidar:
_Ela estaria bem melhor longe de você, isso sim!
Amado e Kawaki se encararam por alguns segundos em silêncio, momento que foi quebrado quando Sumire começou a retirar os eletrodos do tórax de Kawaki, fazendo este olhar para ela e Amado se voltar novamente para a tela do computador na bancada.
Kawaki reparava que Sumire mantinha o olhar baixo e sentiu certa tensão emanando da garota. Quando Sumire terminou de tirar os eletrodos, encarou Kawaki nos olhos de maneira séria, quase imponente. Kawaki franziu o cenho sem entender aquilo. Sumire então pegou outras folhas de papel toalha e as pressionou contra a parte curta e loira do cabelo de Kawaki e também teve que envolver um pouco da parte longa e castanha que tinha ficado suja do gel na tentativa falha de Kawaki limpar o cabelo. Dessa vez Kawaki permaneceu mudo sem questionar a atitude da arroxeada, na verdade ele estava com uma cara de bobo esperando Sumire terminar. Ele pensava: "Aff, por que é tão bom sentir ela mexendo no meu cabelo?".
Sumire recolheu o papel toalha utilizado, inclusive o que estava jogado na came, e se afastou andando até uma lixeira que ficava perto da porta da sala para jogar o papel fora. Ela disse enquanto se deslocava:
_Pronto, pode se vestir e sair, encerramos._sua voz soou sem nenhuma emoção.
Kawaki lambeu o lábio inferior e vestiu a camiseta rapidamente se levantando da cama em seguida.
Sumire saiu de perto da lixeira na intenção de andar até a outra ponta da bancada onde também tinha uma cadeira e um computador para o uso dela. Mas Kawaki a interrompeu no meio do caminho ficando de frente para ela. Os dois se olharam fixamente por três segundos sem dizer nada.
Então Kawaki repuxou o canto boca e soltou o ar pelo nariz dizendo:
_Acho que se você aguenta a cara do Amado todo dia, não vai ser a minha que vai te enjoar, né, roxinha?
Sumire, que até aquele momento mantinha o rosto com uma expressão neutra, entreabriu a boca surpresa ao ouvir o "apelido" que acabara de receber, ela se recompôs rapidamente e respondeu séria:
_Eu não estou fazendo nada que não tenha sido minha própria escolha.
Kawaki arfou:
_Que bom pra você, eu não tive essa sorte._Disse já dando as costas para Sumire e se dirigindo à porta.
Sumire olhou as costas de Kawaki, sentindo um aperto no peito e falou alto:
_Kawaki-kun!
Kawaki se deteve por um momento, parando já perto da porta, mas não olhou para Sumire. A arroxeada respirou fundo desistindo de falar alguma coisa, então Kawaki voltou a caminhar saindo da sala e fechou a porta atrás de si.
Sumire ficou cabisbaixa e foi sentar-se na cadeira disponível na bancada. Amado a olhou com o canto dos olhos e disse:
_Não espere muito dele, srta. Kakei.
Sumire franziu o cenho e retrucou serena:
_O senhor não devia subestimá-lo.
Amado deu um riso abafado:
_Entenda, apenas estou te aconselhando a não se envolver emocionalmente com ele.
Sumire replicou convicta:
_Não sou capaz de tratar um ser humano sem considerar os sentimentos dele.
Amado:
_Hã, então só toma cuidado pra essa sua "grande consideração" não acabar te arruinando._Deu uma pausa._ "Roxinha"._ disse sarcástico.
Sumire engoliu em seco e sentiu um calafrio. Aquela conversa de Amado soava ameaçadora. Afinal, a escolha de Sumire estar ali era justamente para proteger Kawaki e Boruto, de qualquer coisa inescrupulosa que Amado estivesse tramando.
Sumire terminou em dez minutos de compilar os dados que foram incumbidos a ela, os enviando a Amado, e se levantou em seguida. Ela informou que iria se encontrar com Nue na sala de treinamento, local em que ele costumava ficar quando estava no Departamento Científico, pois não podia acompanhar Sumire diretamente no trabalho dela.
Enquanto Sumire caminhava pelos corredores, calculava que precisava ser mais cautelosa, Amado parecia se incomodar com qualquer proximidade que ela tivesse com Kawaki além do nível profissional. Mas se fosse pra se equiparar ao "nível de profissionalismo" que Amado julgava ser o correto, Sumire simplesmente teria que ser o gelo de um iceberg, ela não conseguia agir assim, ela não conseguia ignorar quando via Kawaki sofrendo. E foi assim que ela havia agido desde a primeira vez que o viu, eles eram tão parecidos.
Sumire chegou à sala de treinamento que ficava no bloco anexo ao prédio principal do Departamento Científico. Ela logo encontrou Nue que pulou no ombro esquerdo dela, Sumire se aproximou do dojo e sentou-se na borda dele, colocou Nue com a cabeça deitada em seu colo e lhe infundiu chacra o fazendo ficar do seu tamanho de tigre, Sumire então abraçou o pescoço do amigo, afundando o rosto em seus pelos, suspirou dizendo:
_Ai, Nuezinho, tem horas que eu me sinto tão sem chão por causa do Amado, é tão difícil lidar com ele.
_Você devia largar de vez esse emprego, roxinha.
Sumire ergueu o rosto vendo Kawaki se aproximando, ele estava vindo da direção do banheiro da sala de treinamento, com o cabelo molhado. Sumire se levantou rapidamente e olhou para Kawaki questionadora. Ela notou que a roupa dele também estava ligeiramente molhada:
_Você estava lavando a cabeça na pia?!
Kawaki sorriu de canto:
_Não, tomei um banho de chuveiro mesmo, mas não achei toalha então...
Sumire ficou com a boca entreaberta:
_Hã... não imaginei que você iria querer tomar um banho improvisado no departamento.
Kawaki arqueou a sobrancelha esquerda:
_Ah tah, se você imaginasse ia trazer uma toalha pra mim, né?
Sumire arregalou os olhos:
_Olha, eu até consigo uma toalha agora se você quiser. Afinal que ideia foi essa de tomar banho do nada?
Kawaki torceu a boca:
_Sei lá, minha cabeça e meu peito começaram a coçar e queimar, estava insuportável.
Sumire estreitou o olhar se aproximando do rosto de Kawaki e disse:
_Nossa, você teve uma dermatite de contato? Deixa-me ver.
A arroxeada ficou na ponta dos pés para observar melhor o couro cabeludo de Kawaki, o qual estava fazendo uma cara meio ressabiada enquanto era "examinado".
Nue voltou para seu tamanho miniatura e pulou para o ombro de Sumire interessado no exame que a garota fazia em Kawaki.
Sumire disse com um olhar analítico:
_Hmm, o couro cabeludo está um pouco vermelho mesmo._ ela usou os dedos das duas mãos para afastar os cabelos de Kawaki e enxergar a pele melhor_mas não está descamando.
Sumire voltou a ficar sobre as plantas do pés retirando as mãos do cabelo de Kawaki, ela voltou o olhar para o tórax do garoto e disse:
_Você disse que teve coceira no peito também? Ficou vermelho?
Kawaki tirou a camiseta a segurando na mão direita enquanto dizia:
_Acho que sim, mas também foi porque que cocei. Tá vendo alguma coisa?
Sumire estava concentrada focando o olhar nos pontos em que os eletrodos estavam colados:
_Talvez. Posso?_Sumire pediu permissão para tocar em Kawaki, ele assentiu com um gesto de cabeça, Sumire pressionou levemente o indicador em dois dos pontos onde estavam os eletrodos_Tem resquício do adesivo. Mas não parece que teve alguma reação na sua pele, a coceira deve ter sido pelo incomodo físico apenas.
Kawaki torceu as sobrancelhas e esfregou os dedos onde achava que estava o adesivo:
_Achei que eu tivesse tirado no banho.
Sumire:
_Que sabonete você usou?
Kawaki:
_Nenhum, foi só água quente mesmo. Mas eu esfreguei bastante. O gel do cabelo saiu fácil.
Sumire:
_Ah, claro, o gel é hidrossolúvel, mas o adesivo só sai com um componente bipolar no nível de detergente pra dissolver.
Kawaki:
_Aff, os dois são uma porcaria, pra que quê tem fazer esses testes chatos, ainda saio daqui todo grudento e me coçando.
Sumire:
_Você também teve coceira da primeira vez?
(Aquela era a segunda vez em que Kawaki fazia um checkup aprofundado daquele nível.)
Kawaki respondeu enquanto vestia a regata de volta:
_Não.
Sumire:
_Hmm, acho que a marca do gel de hoje é nova, mas os adesivos dos eletrodos são os mesmos da outra vez.
Kawaki:
_Acho que hoje demorou bem mais, não? Deve ser isso que fez grudar mais.
Sumire:
_Sim, verdade. Você dormiu bastante.
Kawaki torceu as sobrancelhas:
_Melhor da próxima vez, você não tentar me acalmar quando eu tiver um sono agitado, assim eu acordo mais rápido.
Sumire:
_Não é assim que funciona, você precisava se manter um tempo no sono REM para nós conseguirmos avaliar. Acontece que a maior parte do seu sono é mais leve e quando você chegou ao REM, que é o nível mais profundo do sono, seus parâmetros logo se alteraram drasticamente, nós precisávamos te compensar para o exame não vir falseado.
Kawaki ouvia a explicação de Sumire atento, ele limpou a garganta e perguntou manso:
_E... quanto tempo você precisou ficar segurando a minha mão?
Sumire arregalou ligeiramente os olhos os piscando em seguida e então disse:
_Foi... perto de meia hora.
Kawaki desviou o olhar e disse:
_Você não vai ter que fazer isso de novo, vai?
Sumire mordeu o lábio inferior e disse:
_Hã, não é um método científico consolidado, mas...
Kawaki voltou a olhar pra ela:
_Mas?
Sumire:
_Mas posso usar de qualquer recurso a meu alcance.
Kawaki deu um sorriso sarcástico:
_"Qualquer recurso" que incluiu mãos dadas. Você gosta de falar difícil, né, roxinha?
Sumire colocou as mãos na cintura:
_O importante é que você consegue entender.
Kawaki comentou brincalhão:
_Hã, quem disse que eu entendo?
Sumire:
_Ora, se não entendesse a gente nem conversaria tanto.
Kawaki:
_Hmm, será que a gente conversa tanto assim? Você só trabalha. Aliás, agora está no seu intervalo de almoço, já?
Sumire sorriu de canto:
_Sim, mas eu saí uns 10 minutos antes e vim ficar com o Nue._Afagou o pescoço do amigo felpudo.
Kawaki:
_E vai fazer o quê no intervalo além de almoçar?
Sumire:
_Ah, eu pensei em... ir conversar com o sr. Katasuke que me pediu ajuda com os estagiários novos...
Kawaki abafou um riso pelo nariz:
_Tá vendo, eu sabia. Você não pára de trabalhar nem no horário livre. Mas você sente falta de ser da equipe do Sr, Katasuke, não sente? Podia desistir de ficar com o Amado.
Sumire:
_Bem, eu continuo dando uma contribuição de vez em quando pra minha antiga equipe, mas o trabalho com o Amado é mais importante e me exige grande dedicação. Como eu disse antes, foi minha escolha e eu vou mantê-la.
Kawaki arfou:
_Sei.
Sumire torceu a boca:
_Por que você quer que eu desista?
Kawaki estalou a língua:
_Não tô falando que eu quero, só digo que ficar perto do Amado é tóxico.
Sumire respondeu resoluta, mas um tanto melancólica:
_Bem, eu já tenho imunidade a pessoas tóxicas depois de ter superado o meu pai.
Kawaki uniu as sobrancelhas:
_Seu... pai... Ah, sei lá, justamente por ter passado por tanta dor você devia ficar longe de gente ruim. Acho que isso também devia me incluir.
Sumire uniu as sobrancelhas:
_Não fala isso, Kawaki-kun, você não é gente ruim!
Kawaki desviou o olhar:
_Você não devia ter tanta certeza disso.
Sumire disse amavelmente embora firme:
_Não seja injusto consigo mesmo Kawaki-kun, você tem um bom coração e não teve culpa de ter sido usado por monstros como o Jigen ou Ishiki. Agora que você teve uma chance de recomeço com o Nanadaime e os amigos da Vila da Folha, você não pode se deixar abater com esse tipo de pensamento.
Kawaki ficou cabisbaixo e sussurrou:
_Falar é fácil...
Sumire chegou mais perto de Kawaki e colocou a mão no rosto dele o fazendo erguer o olhar a fitando de volta, Sumire disse esperta:
_Ei, você quer sair pra almoçar comigo?!
Kawaki arregalou os olhos:
_Sério? Você não ia ter que ficar no Departamento pra resolver-
_Eu resolvi usar o meu horário de folga pra não trabalhar, vamos._Sumire interrompeu a fala de Kawaki, já tirando a mão do rosto dele e a usando para segurar o punho dele, o puxando na direção da porta da sala de treinamento.
Nue pulou do ombro de Sumire voltando para o chão. Kawaki fingiu resistência ficando parado e dizendo:
_Calma, eu nem respondi que aceitava o seu convite.
Sumire olhou para Kawaki sem se abalar:
_Vai recusar? Eu pago._insistiu o puxando novamente.
Dessa vez Kawaki a acompanhou e seguiu caminhando para sair da sala de treinamento, nesse ponto Sumire não segurava mais o punho de Kawaki que disse:
_Se você está pagando, então eu aceito, eu deixei minha carteira em casa.
Sumire olhou duvidosa para Kawaki:
_Ahh, era esse o problema então?
Kawaki deu risada:
_Não, eu estava brincando. Eu estou com minha carteira sim. Eu posso pagar o meu almoço.
Sumire riu:
_Pode deixar que quem faz o convite é quem paga.
Kawaki torceu as sobrancelhas. Ele lembrou-se de que essa frase foi ele quem fez na última e única vez em que saiu a sós com Sumire para o cinema. Na realidade quem estava pagando era Hinata, pois na época Kawaki ainda não fazia missões como ninja e não tinha uma renda. Sumire também se lembrou desse último "suposto encontro" deles, que na verdade tinha acontecido a convite de Kawaki, mas que não o tinha feito com nenhuma intenção romântica, já que inclusive, inicialmente, era para eles terem sido acompanhados de Naruto, o que acabou não ocorrendo já que quando finalmente marcaram o dia do cinema, Kawaki já caminhava por Konoha sem a vigilância pessoal de Naruto, que só durara as semanas iniciais de sua chegada à vila.
Já havia se passado quase três meses desde o tal episódio, que inclusive não havia terminado tão bem, pois na despedida Kawaki não soube dosar o grau de intimidade de um abraço deixando Sumire um tanto assustada a fazendo literalmente fugir dele. Eles nunca tocaram nesse no assunto depois do ocorrido, mesmo porque passaram quase um mês sem nem se verem, já que no dia seguinte Kawaki viajou para a Vila da Névoa numa missão de escolta e acabou se envolvendo numa Guerra. E Depois que retornou à Vila, Kawaki estava bem mais frio e fechado, falando minimente com Sumire durante os checkups no Departamento Científico.
Todavia, depois que Kawaki iniciou uma nova missão se tornando aluno da Academia Ninja sendo colega de Himawari, ele se tornou mais receptivo e seu semblante frívolo fora substituído por um tom mais amigável. Entretanto ter que passar mais de uma hora na presença de Amado já deixava o garoto estressado.
Ao chegarem ao prédio principal do Departamento Científico, Sumire se dirigiu ao repouso feminino onde guardava sua mochila, ela chamou Kawaki para acompanhá-la.
Kawaki estranhou:
_Por que você quer que eu entre aí com você?
Sumire:
_Eu preciso pegar as minhas coisas pra gente sair e eu falei que ia te arrumar uma toalha, lembra?
Kawaki então entrou no repouso, que eram basicamente um quarto grande com uma cama de solteiro e duas beliches, cinco armários altos de metal, um banheiro separado por uma porta de correr, uma escrivaninha com cadeira, ar condicionado. Enquanto Sumire pegava as coisas em seu armário Kawaki observava ao redor dizendo:
_Você também dorme aqui?
Sumire:
_Hã... eu não, mas tem gente que tira uns cochilos nos intervalos.
Kawaki sentou numa das camas testando a mola do colchão:
_Até que dá pro gasto, se eu trabalhasse aqui com certeza ia aproveitar os intervalos.
Sumire pegou uma toalha de rosto do armário caminhando até Kawaki e começou a enxugar os cabelos dele suavemente enquanto dizia:
_Se você trabalhasse aqui? Acho que você não tem perfil pra isso.
Kawaki tomou a toalha das mãos de Sumire e passou a enxugar ele mesmo os cabelos de forma mais bruta.
_Sei, o perfil daqui é morrer de trabalhar, sem nenhum descanso, né?
Sumire fez uma careta. Kawaki terminou de enxugar os cabelos que ficaram totalmente arrepiados, ele levou a toalha próxima ao nariz a cheirando e comentou casualmente:
_Essa toalha tava limpa?
Sumire ficou um pouco sem jeito:
_Ahhh, e-eu já tinha usado duas vezes, você achou que está suja?!_ Sumire pegou a toalha rapidamente da mão de Kawaki a verificando_ E-eu achei que ainda estava boa para usar, desculpa.
Kawaki abafou um riso:
_Não esquenta._ Enquanto isso ele pensava "A toalha está é com um cheiro muito bom, acho que é do xampu que ela usa."
Sumire também cheirou a toalha e notou a mistura dos aromas, sendo que reconhecia o cheiro dela própria e um mais fresco de Kawaki, o qual ela não conseguia definir, não era perfumado nem desagradável, apenas um cheiro úmido, masculino, neutro, mas marcante, Kawaki a encarava se divertindo ao ver a concentração da arroxeada na sua "análise odorífica", Sumire ao perceber o olhar de Kawaki sobre si, afastou a toalha a devolvendo para o seu armário e comentou meio constrangida:
_Vou levar pra casa pra lavar depois._ela se voltou observando o estado do cabelo de Kawaki_ Você quer um pente ou um escova?
Kawaki torceu as sobrancelhas.
_Eu não uso essas coisas.
Sumire:
_Sério? Como que seu cabelo não embaraça?
Kawaki se levantou da cama e foi ajeitando os cabelos com os dedos.
_É curto, né. Basta mexer nele de qualquer jeito depois que lava, e fica de boa.
Sumire torceu a boca:
_Humm, acho que isso só funciona se você tiver lavado com xampu e condicionador...
Kawaki:
_Cadê um espelho, tá tão feio assim?
Sumire:
_Ergh, feio, feio, não... mas tá mais bagunçado que o normal.
Kawaki foi até o banheiro onde tinha um espelho maior:
_Aff, nunca vi ele ficar arrepiado desse jeito. Mas que se dane.
Kawaki ia saindo do banheiro e viu Sumire se aproximando com um frasco na mão. Kawaki olhou desconfiado e perguntou:
_Pra que isso aí?
Sumire:
_É creme pra pentear, tenta passar um pouquinho.
Kawaki:
_Mas eu já disse que não uso pente.
Sumire:
_Não precisa usar o pente, passa um pouco do creme e ajeita com os dedos como você costuma fazer.
Kawaki torceu as sobrancelhas:
_Isso ai não vai me dar alergia?
Sumire:
_Ah, a sua alergia foi ao gel de condução, mas de qualquer forma se o creme ficar só nas pontas dos cabelos sem entrar em contato com o couro cabelo, o risco de alergia é quase zero.
Kawaki pegou o frasco da mão de Sumire e olhou pra ele meio hesitante, então disse:
_Não sei usar essas coisas.
Sumire apontou para a cama:
_Tá, senta aí.
Kawaki sentou-se, Sumire ficou de pé de frente para ele, pegou o frasco do creme e colocou uma quantidade mínima na palma de sua mão direita, devolveu o frasco para que Kawaki e o segurasse, então espalhou o creme passando dos dedos de uma mão para a outra e usou os dedos para espalhar o creme nas pontas dos cabelos castanhos de Kawaki, os massageando homogeneamente. Kawaki fechou os olhos sentindo aquilo como um afago e aproveitou o cheiro do creme enchendo suas narinas, lembrava flores ou frutas suculentas.
Sumire não levou mais que dois minutos naquilo, então parou e observou a cara de deleite de Kawaki, que assim que sentiu que Sumire tinha parado, abriu os olhos e tentou disfarçar comentando debochado:
_Além de enfermeira virou cabelereira também, roxinha?
Sumire sorriu travessa pegando de volta o creme das mãos de Kawaki dizendo:
_Sou multi-tarefas.
Kawaki arqueou a sobrancelha esquerda, e sorriu minimamente. Sumire continuou:
_Mas vai lá no espelho do banheiro "passar a mão" do jeito que você faz pro cabelo ficar do jeito que você gosta.
Kawaki:
_Ué, por acaso do jeito que você fez ficou diferente do jeito que eu uso?
Sumire:
_Ficou sim, não está tão rebelde.
Kawaki levantou-se da cama e foi ao banheiro se olhar no espelho:
_Ahh, não tá ruim, vou deixar assim.
Sumire replicou brincalhona:
_Hmm, tá certo, que bom que meu penteado foi aprovado pelo meu cliente.
Kawaki saiu do banheiro e respondia no tom da brincadeira:
_É... eu não sou um cliente exigente.
Sumire guardou o creme na mochila dela e pegou uma bolsa menor que também estava no armário, sendo esta uma em que guardava dinheiro.
Sumire sinalizou para Kawaki segui-la para fora do quarto:
_Vamos.
Os dois saíram no corredor topando de cara com uma persona non grata:
_Hmmm, vocês dois ficam fazendo o que sozinhos no quarto?_Amado perguntou com um olhar julgador.
Kawaki franziu o cenho:
_Não é da sua conta, velhote.
Sumire respondeu ao mesmo tempo:
_Nada de mais, só pegando minhas coisas e enxugando o cabelo do Kawaki.
Kawaki puxou Sumire pela mão já se desvencilhando de Amado:
_Dá licença, a gente não te deve explicação._continuou andando pelo corredor junto da arroxeada.
Amado ficou de boca entreaberta observando os dois se afastando, enquanto pensava: "Só me faltava essa, foi só começar a viver em sociedade que esse moleque já está de gracinha por causa de uma garota! Nem pra ter escolhido outra mais sonsa, mexer com a Kakei vai afetar o meu trabalho..."
CONTINUA