
BEAUTIFUL SMILE
- Ei, você está bem?- April pergunta ao perceber depois de algum tempo que ambas passaram fingindo não notar a presença uma da outra enquanto debruçaram-se sobre suas respectivas janelas, e a garota, Sterling, estava chorando.
Elas nunca realmente tiveram uma conversa, nunca se falaram, apesar da proximidade entre suas casas, mas April sabia quem era ela: ela é Sterling Wesley, frequentavam a mesma escola, embora fizessem parte de grupos completamente distintos no pequeno círculo social do Ensino Médio de uma escola particular em Atlanta, cidade onde ela passou a vida toda recebendo informações aleatórias da garota, da maneira como quem estudava na mesma escola e morava no mesmo bairro deveria receber. Sabia que ela era muito apegada a sua irmã gêmea, sabia que Sterling estava no time de futebol feminino do colégio, e em algumas de suas aulas. Mas, com certeza não sabia o suficiente para entender porque a menina estava chorando em sua janela às 2:00am de uma quarta-feira.
-Sim.. Sim, eu estou.- Ela discretamente respira fundo, secando os olhos com as pontas dos dedos, e até arrisca um sorriso. Não havia muita coisa nova para se reparar na menina: era um rosto perfeitamente familiar para ela, que havia ganhando de April, até agora, apenas a atenção que demandava ganhar por ser um rosto tão bonito que cruzava com ela algumas vezes no dia, mas April se vê encarando-a mesmo assim, como se houvesse algo a mais para descobrir.
-Tem certeza?- April pergunta naquele tom estranho de um grito sussurrando entre as duas construções, e a garota loira balança a cabeça confirmando, e parecendo um pouco constrangida de uma forma que faz April imaginar que não foram muitas pessoas que a viram chorando.
-Só.. namorado. você sabe.- Ela balança a mão na frente do rosto, como se o assunto não fosse realmente nada demais, mas seus lábios pressionam um a outro quando ela deixa seu olhar desviar de April e cair no gramado, para a cerca de madeira. -Na verdade, ex.. namorado.
-Urgh. Que merda. Eu sinto muito.- Ela diz e recebe apenas mais um sorriso, que parece ter tomado mais esforço que o anterior. Uma pausa se dá, e April percebe o quanto seria estranho se ela apenas voltasse para o seu quarto novamente, dado o tempo que já havia passado aqui em um silêncio conveniente antes de realmente perguntar o que estava errado com Sterling. Diante disso ela decide continuar a conversa. -Ele foi um babaca?
-Ele é um babaca, eu nem sei por que perdi meu tempo com isso.- Sterling responde daquela maneira confessional com a qual se fala com um estranho no meio da madrugada, quase como se April fosse deixar de existir após aquela conversa pelo simples fato de ela não fazer parte do seu cotidiano, como se isso lhe concedesse liberdade para falar o que quisesse, mas April não se incomoda. Ela não está com sono, afinal de contas, e pode perceber que Sterling realmente poderia desabafar uma coisa ou outra. -Então.. eu terminei com ele.
-Pelo menos você quem terminou com ele. Imagina as fofocas na escola.- Sterling dá de ombros, incerta de como proceder diante de um clichê grande demais para existir ao seu redor, e visto que não sabe, nem irá procurar saber nada sobre a situação, porque parece invasivo demais. Mas é a primeira vez que consegue fazer Sterling rir, e isso a deixa ainda mais interessada na interação: ela gostou da sensação de fazê-la rir, e Sterling tinha um lindo sorriso.
-É, eu acho que posso contar isso como uma vitória.- Sterling casualmente seca seu rosto com os dedos, e ri de uma forma debochada, levantando o olhar para April. -Eu nem sei por que estou chorando, eu nem gostava dele tanto assim.
-Então eu realmente só vejo vitórias nisso tudo. April dá de ombros, e é a segunda vez que faz Sterling rir de verdade. A loira balança a cabeça, como se pensar daquela maneira fosse errado por mais que veja graça no que April diz. April pensa sobre a maneira como Sterling parecia constrangida ao contar os motivos do seu choro, e considera que talvez a garota não vá contar detalhes da situação para mais ninguém, então decide diante disso, se esforçar ao máximo para dizer algo útil.
-Ei, está tudo bem. Você pode ter qualquer reação que quiser, mesmo que não ache apropriado. Só... sinta as coisas como tem que sentir. Não há regras nisso. Não tem ninguém te julgando.
O olhar de Sterling fica mais fixo do que estava durante toda a conversa, e ao retribuir, April tem a chance de reparar na maneira como as luzes de fora refletiam na pele branca de Sterling, e a deixavam atraente de uma forma que fazia April se sentir ligeiramente nervosa por estar tão sozinha com ela, mesmo com uma distância de metros. Enquanto ela parece reconsiderarrr o que April disse, com uma sombra de um sorriso aliviado em seu rosto, e April se sente ainda mais satisfeita por de fato conseguir ajudar a garota. -Isso é reconfortante, na verdade.
April sorri, balançando a cabeça. -Feliz em lhe ajudar.
-E você? O que está te deixando acordada até agora?- Sterling levanta a mão para apontar o indicador para April, questionando-a com uma das sobrancelhas levantadas, e April fica corada ao se lembrar da razão de sua falta de sono. Apesar da vergonha, seria injusto demais não ser totalmente sincera com Sterling em uma situação como essa, então ela apenas suspira, e se prepara para parecer uma idiota na frente de uma garota bonita.
-Ok, então você quer a verdade?- Sterling balança a cabeça se inclinando sobre a janela, ainda mais interessada na resposta para a sua pergunta. -Eu assisti a um filme de terror, e agora não consigo mais dormir, é isso.
Sterling morde o lábio inferior, mas o tremor em seus ombros denuncia as risadas que ela tenta conter ao perguntar. -Você está brincando, certo?
-Eu queria muito estar.- April deixa a cabeça cair nas mãos que tem juntas sobre batente da janela, e as usa para jogar o cabelo para trás antes de voltar a olhar para Sterling, que desiste de tentar fingir que não acha graça daquela situação.
Por um lado, April sente-se terrivelmente envergonhada. Por outro, Sterling está gargalhando, e parece ter esquecido momentaneamente o que a incomodava, e April decide que aquilo vale o constrangimento. -Eu tive a brilhante ideia de assistir ao Exorcista sozinha, sendo que tenho aula amanhã.
-Não a coisa mais inteligente a se fazer.
Uma luz se acende no quarto em que Sterling está, e ela se vira para ter uma conversa breve com alguém dentro do cômodo, que April não consegue ver ou ouvir de sua posição, mas aguarda pacientemente até que a garota se volte para ela.
-É a minha Blair, a minha irmã. Ela é um bebê que não consegue dormir com barulhos ao redor dela.- Uma almofada é lançada na direção de Sterling quando ela completa a frase, e ela ri verdadeiramente pela a segunda vez na noite, jogando o objeto de volta para a sua agressora, que April presume ser a sua irmã. Sterling parece outra pessoa completamente diferente da que April observava chorar sozinha em sua janela, e isso a deixa satisfeita ao ponto de deixar o seu típico sorriso de lado em seu rosto.
-De qualquer forma, eu tenho que ir. Estou dividindo o quarto com ela, então...
Ela dá de ombros, revirando os olhos como se aquela fosse o seu maior problema, e April sorri.
-Okay. Você deveria dormir também, dizem que ficar acordada depois das 2:00am só faz a gente pensar besteiras.- April diz em uma preocupação genuína, e Sterling sorri. Novamente, verdadeiro, e April se pega pensando que gosta disso mais do que deveria, considerando que é a primeira vez que as duas trocam palavras de fato.
-Eu vou. Obrigada.- Ela balança a mão em um aceno. -Boa noite, April. Não deixe nenhum demônio balançar a sua cama.
April ergueu as sobrancelhas em surpresa, mas não pergunta como ou por que Sterling lembra seu nome. Ao invés disso, apenas retribui seu singelo aceno, e observa enquanto a luz fraca do quarto de Sterling se apaga, como se a chamasse para dentro.
-Eu não vou. Boa noite, Sterling.- e a menina some para dentro do quarto escuro.