
“Não é o destino que define quem somos, mas as escolhas que fazemos ao longo do caminho, mesmo que elas nos destruam”
A lua cheia iluminava a vila de Konoha, suas sombras caindo sobre os telhados como um lembrete silencioso de tudo que eu havia feito. Às vezes, a luz parecia me acusar, e outras vezes, parecia me compreender. Eu não acreditava em destino. Não naquele que queriam que eu acreditasse. Para mim, destino era uma escolha, assim como as “almas gêmeas” e eu havia escolhido Iruka.
Desde o momento em que percebi que ele era minha âncora em um mundo repleto de caos, nada mais importou. Nem as tradições, nem os laços impostos, nem mesmo a ideia de almas gêmeas. Almas gêmeas… Uma piada cruel dos deuses para controlar nossas vidas, ou talvez apenas mais uma lenda para mascarar as incertezas da vida. Foi isso que eu disse a mim mesmo quando o vi pela primeira vez.
Minha alma gêmea.
No entanto, assim como qualquer outra pessoa, mesmo ignorando aquilo, não acreditando eu ainda tinha uma. E um dia ela apareceu.
Era um dia comum, como qualquer outro, uma noite que havia retornado de uma missão e tudo o que desejava era estar nos braços de Iruka, mas o impacto foi inegável. A conexão foi tão visceral que eu não pude ignorar. Seus olhos me refletiam, suas palavras eram como ecos dos meus próprios pensamentos. Eu sabia, com uma certeza que me enojava, que era ela. A pessoa com quem o universo havia me amarrado.
Mas não era ele. Não era Iruka.
Eu lembro da primeira vez que o vi sorrir, o som da sua risada. Era como uma calmaria no meio de uma tempestade. Ele não era grandioso, nem exótico, mas era real. Era humano de uma forma que eu achava impossível. E, por isso, ele era tudo. Iruka não era minha alma gêmea, mas era o que eu queria. O único que eu queria.
A memória daquela noite ainda me assombra às vezes, como um eco de um passado que eu me esforcei para enterrar. A voz dela, Sayomi, era uma melodia que parecia feita para me atingir, mas o conteúdo de suas palavras era como um veneno que eu nunca poderia aceitar.
Eu a evitei o máximo que pude. Evita cruzar seu caminho, evitava missões onde ela estaria, evitava encontros com amigos onde sua presença também aconteceria.
Então, eu lutei. Contra o destino. Contra a ligação que me puxava para aquela mulher, para aquele vazio inevitável que me afastaria de Iruka. No início, eu tentei simplesmente ignorá-la, mas ela não deixava. Ela me procurava, insistia, como se soubesse que deveria estar ao meu lado. Era cruel. O universo era cruel.
O tempo passou, e cada vez que eu via Iruka, cada sorriso que ele me dava, minha decisão ficava mais clara. A mulher começou a perceber. Ela chorou, gritou, implorou. Eu a ignorei por várias vezes. Fingia que o que ela dizia não era para mim. Eu a ouvia dizer que estava negando o que éramos, que eu estava quebrando algo sagrado. Ela tinha razão. Eu estava quebrando algo. Mas o que é o destino, se não algo que pode ser despedaçado?
No entanto, um dia, nos encontramos no meio da floresta, longe dos olhares curiosos de Konoha. A lua iluminava sua figura esguia, e seus olhos, tão parecidos com os meus, queimavam com uma mistura de dor e frustração. Mas também havia uma determinação furiosa em seu olhar. Eu conhecia aquela jeito de me encarar, era como estar olhando nos olhos dos meus inimigos antes de uma luta. Ou encarar a morte quando tudo parecia ter chegado ao fim. Porém, a minha história junto a Iruka estava apenas começando, havíamos escrito apenas as primeiras páginas e não a encerraria sem vivê-la em sua plenitude, até o fim dos meus dias ao seu lado.
— Kakashi — ela começou, sua voz carregada de emoção. — Você sabe o que somos. Não pode negar isso. Eu sou sua alma gêmea. O universo nos uniu, e você sabe tão bem quanto eu que ninguém pode substituir isso.
Ela deveria saber que não sou qualquer um.
Eu a encarei por um longo momento, tentando decidir se valia a pena argumentar.
— Sayomi — comecei, minha voz tão fria quanto a brisa daquela noite — eu nunca quis isso. Eu não pedi por uma alma gêmea. Isso foi imposto a mim, e eu nunca aceitei.
— Mas não é algo que você pode rejeitar! — Ela gritou, dando um passo em minha direção. — Nós somos parte um do outro! Você sente isso, não sente? Diga que sente! Esse vazio, essa falta... ela nunca vai embora se você continuar negando o que somos!
Eu segurei seu olhar, firme, sem ceder.
— Eu sinto, sim. Mas eu escolhi preencher esse vazio com outra pessoa. Alguém que eu amo, não por obrigação, não por destino, mas porque ele é tudo que eu quero. Iruka é o meu mundo, e não importa o que você ou o universo digam. Minha decisão já foi tomada e não vou desistir dele. Por nada, nem por ninguém.
Sayomi hesitou, como se minhas palavras a tivessem atingido fisicamente. Seus olhos brilharam com lágrimas que ela tentou, em vão, conter.
— E o que eu sou, então? — ela sussurrou. — Apenas um erro do destino? Um peso que você precisa carregar para sempre?
— Você é um símbolo de algo que eu me recusei a aceitar — respondi, minha voz baixa, mas firme. — E é por isso que precisa acabar. Eu não vou deixar que você destrua o que construí com Iruka. Não vou deixar que você tome algo que nunca foi seu. Já perdi muita coisa nessa vida. Já me privei de muita coisa. Mas disso, desse sentimento, por ele eu faço qualquer coisa.
Ela ficou em silêncio por um momento, e então, com uma expressão que misturava mágoa e compreensão, murmurou:
— Você está disposto a destruir até mesmo a sua alma para ficar com ele?
Entendi o que ela quis dizer e a ameaça por trás daquela pergunta, por isso, sem hesitar, eu respondi:
— Se for preciso, sim.
Foi a última conversa que tivemos. E foi a última noite em que a voz dela ecoou na minha vida.
Naquela noite, quando o frio cortava os céus de Konoha, eu tomei minha decisão final. Eu sabia que não poderia apenas afastá-la. Ela nunca pararia. Nunca aceitaria que eu escolhi Iruka, e não ela. Então, com as mãos que já haviam ceifado tantas vidas, fiz o impensável. O sangue manchou minhas luvas, mas foi rápido. Limpo.
Pensei que sentiria culpa. Talvez até sentisse, se tivesse permitido que minha mente vagasse para lá. Mas tudo que senti foi alívio. Alívio porque agora eu era livre. Livre para amar Iruka como queria. Livre para fazer o meu próprio destino.
Hoje, eu ainda me pego pensando em quem eu poderia ter sido, se tivesse aceitado o que o universo determinou. Uma pessoa mais pura? Mais nobre? Não importa. Porque o homem que eu sou agora, o homem que escolheu Iruka, é o único que eu quero ser.
Eu o observo enquanto ele dorme, seus cabelos bagunçados, sua respiração tranquila. Meu peito aperta com algo que não é arrependimento. É amor. Amor por ele, e amor pela escolha que fiz. Porque, no final, não importa o que os deuses digam. O destino nunca teve chance contra mim.
E nunca terá.