
1. harry james potter
Em um pitoresco vilarejo chamado Godric’s Hollow vivia uma família de três. Eles ocupavam o que um dia havia sido um casebre mal-acabado na visão da maioria das pessoas, mas atualmente era um charmoso chalé de dois andares com um jardim bem-cuidado e cerca branca.
Aquela família de três era composta por uma viúva que perdera o marido numa idade muito precoce, um fatídico acontecimento na verdade, havia também seu filho mais velho de 16 anos e o filho caçula prestes a completar catorze. Eles eram conhecidos por todos ali como ‘Os Potter’.
A Sra. Potter era uma mulher bonita de trinta e sete anos, dona dos olhos mais verdes e gentis que qualquer um teria a felicidade de conhecer. Ela havia se casado e tido filhos muito jovens, o marido da Sra. Potter havia sido assassinado há quinze anos e deixado a mulher viúva, grávida e já com um filho para cuidar.
Seu filho mais velho era um rapaz agradável e gentil, ele havia herdado aquela característica da mãe, mas também era audacioso, impulsivo e arrogante como a maioria dos jovens de dezesseis anos. Ele também tinha olhos muito verdes que pareciam sempre arrancar a verdade mesmo do melhor mentiroso, mas sua maior característica era um desprezo incomum as regras que viviam o metendo em confusão na escola – para completo desespero de sua mãe!
O mais jovem do clã, para surpresa de muitos, era completamente o inverso do irmão mais velho. Dono de uma personalidade tranquila e serena, era muitas vezes ele quem apaziguava a situação quando tudo se tornava difícil demais. Enquanto os olhos dele eram castanhos cor de avelã, os olhos do pai que ele sequer tivera a chance de conhecer, seus cabelos eram acaju como os da mãe, com sombras de castanho que o davam um aspecto singular de ‘chocolate-quente’.
Apesar do cenário triste e aparente daquela família, eles conseguiam ser felizes a sua própria maneira. Eles levavam uma vida calma e leve, na medida do possível tendo dois adolescentes em casa, que era observada de longe pelos curiosos que sempre se intrigavam com a determinação dos Potter em permanecerem o mais longe possível dos holofotes.
Muito embora Harry, de todos eles, fosse o que tivesse mais dificuldade para tal feito.
Sentado no velho balanço de pneu, que havia sido construído numa tarde de verão muito semelhante a aquela, só que há mais de uma década atrás, o rapaz contemplava o horizonte e pensava nos últimos anos. Especificamente os últimos seis anos.
Ao longo de seu crescimento, Lily Potter fez o possível para se certificar que seu filho mais velho tivesse uma vida normal – apesar do grande feito em tão tenra idade. Ele frequentou a creche local, brincou com outras crianças e cresceu altamente conscientemente que por algum motivo ele era especial.
Só aos onze anos ele foi entender porque as pessoas o conheciam onde quer que fosse. Ingenuamente, o pobre menino acreditava que sua mamãe era simplesmente uma moça muito popular e que falava muito dos filhos. E foi quando soube o que tinha acontecido de verdade.
Foi aí que Harry entendeu por que o papai não morava com eles, porque ele tinha um machucado na testa que nunca sarava, porque as pessoas o tratavam de maneira tão especial. A resposta era bastante simples na verdade: desde o primeiro ano de vida Harry Potter carregava um fardo em seus ombros. Ele era O Menino-Que-Sobreviveu.
Como se receber aquela informação fosse o que faltasse para desencadear uma série de acontecimentos perturbadores em sua vida, Harry Potter embarcou na plataforma 9 ¾ para seu primeiro ano em Hogwarts. Ele se despediu da mãe, do padrinho, do tio Remus e de um ligeiramente choroso Julian.
Lembrou-se com um sorriso de bagunçar os cabelos ruivos do irmão e prometer escrevê-lo. A mãe dele não deixou de acenar até que o trem sumisse completamente de vista. Harry, anos mais tarde, descobriria que aquela havia sido a coisa mais difícil que Lily Potter tivera que fazer, mais ainda que assistir um homem tentar matar seu bebê – e falhar miseravelmente.
Ele encontrou amigos antigos, como Neville Longbotton, e acabou fazendo amigos novos como Ron Weasley e Hermione Granger. Os três, juntos, foram selecionados para a Grifinória, mas Harry havia corrido um sério risco de cair na Sonserina graças a sua tendência a quebrar regras. Aquele era um segredo que só havia confidenciado ao padrinho, que era então a figura mais próxima de um pai que ele tinha.
Sirius o confidenciara que assim como ele, havia quase ido para a Sonserina – o que era de se esperar pela origem de sua família. Entretanto, ele havia pedido para o chapéu o colocar em uma casa onde irritaria seus pais e acabou sendo junto de James Potter, o pai de Harry.
Harry se orgulhava muito do pai. Não havia tido a oportunidade de conhecê-lo bem, mas sabia que era muito parecido com ele. Sabia por que se lembrava de sua mãe chorar quando ele fazia algo que a lembrava do pai, sabia por que as vezes seu padrinho o chamava carinhosamente de ‘James’, ‘Jimmy’, ‘Pontas’.
Sabia por que nas imagens que estavam espalhadas por toda casa, como numa tentativa desesperada de suprir a ausência da figura paterna, havia um homem com um sorriso encantador, olhos afiados e cabelos extremamente bagunçados. Um brilho especial emanava dele. Era assim que todos se referiam a James Potter, como um homem especial, um verdadeiro herói que havia dado a vida por sua família e enfraquecido o Lorde das Trevas a ponto de ele não ter a chance de matar seu bebê de um ano.
Magia antiga, o professor Dumbledore disse. Uma magia que era evocada pelas famílias antigas, onde os ancestrais agiam como escudos e guardiões daquele membro até que ele atingisse a completa capacidade de se defender. Para os bruxos aquilo era aos 17 anos.
Ao longo de seus onze, doze, treze e sequência, Harry havia enfrentado perigos que a maioria das crianças da sua idade não enfrentavam. Em seu primeiro ano descobriu que seu professor de DCAT estava possuído pelo homem que tinha tentado matá-lo e que havia assassinado seu pai. É claro que Voldemort, como era conhecido, não perderia a oportunidade de acabar com sua vida de novo.
Aos doze ele havia descoberto que não era normal falar com cobras, uma coisa que Harry fazia conscientemente há mais tempo que era considerado saudável. Ele descobriu que havia um basilisco na escola, que Voldemort havia possuído outra pessoa, dessa vez uma garota de 11 anos e usando um diário, e novamente Harry escapara por pouco da morte.
Aos treze anos com a fuga de diversos detentos em Azkaban, Harry constantemente foi perseguido por dementadores. Embora ele tivesse sido treinado por seu tio Remus para se livrar deles, ele quase havia tido sua alma sugada para fora do corpo ao voltar no tempo para impedir que seu melhor amigo fosse mordido por um lobisomem.
Quando acreditou que finalmente teria um ano de paz, foi selecionado para um torneio altamente perigoso e que não queria participar. Aquilo foi a gota d’água para a Sra. Potter e ela estava pronta para tirá-lo da escola. Harry se lembrava do fogo nos olhos de sua mãe, tão conhecida por ser amável e benevolente, mas após o filho por três anos seguidos escapar por pouco com vida durante um período letivo mexia com os ânimos de qualquer mulher – mesmo as mais sensatas como Lily.
Entretanto, o Torneio Tribruxo era um contrato mágico. Harry não tinha opção. Ele teve que competir, de fato, ele ganhou o torneio, mas assistiu seu amigo morrer pelas mãos de Voldemort e mais uma vez mal escapara com vida.
Ainda assim, ele se lembrava daquela noite no cemitério com uma perturbadora saudade no peito. Embora parecesse mórbido, o fantasma de seu pai havia se materializado bem na frente dele e o dito tudo que precisava fazer para escapar vivo dali.
Harry se lembrava de suas palavras, de seu sotaque de York e da maneira como seus óculos estavam tortos em seu rosto. Lembrava-se do pai dizendo ‘Pegue seu amigo e fuja! Solte apenas quando eu der o sinal’.
Aquele foi um verão perturbador. Harry tinha pesadelos constantemente e era chamado de mentiroso por toda comunidade bruxa. Lembrava-se de sua mãe estar considerando se mudar quando Sirius e Lupin a trouxeram de volta ao bom senso.
Harry tinha uma missão. Ele não sabia na época, mas ele tinha uma missão.
Foi seu padrinho que o disse, porque ninguém mais era capaz de dizer. Foi Sirius quem disse o porquê de Voldemort ser obcecado em matar Harry desde que ele era um bebê.
A partir daquele momento, a vida de Harry Potter se tornara voltada a se preparar para quando chegasse a hora de encarar seu destino e encontrar um meio para acabar com aquilo definitivamente.
O mais perturbador de tudo aquilo é que Harry não tinha a menor ideia do que iria fazer.
— Harry?
Ergueu os olhos e percebeu que o irmão caçula caminhava na sua direção. Julian calçava os tênis que agora não serviam mais em Harry, porque embora os Potter tivessem muito ouro, Lily Potter era uma mulher consciente e realista. Julian sempre aproveitava aquilo que estava em bom estado e que tinha pertencido a Harry, assim como o próprio sempre pegava alguma camiseta que Julian não gostara ou já não queria mais vestir já que a diferença de idade entre eles era mínima.
Naquele verão Harry havia tido um surto de crescimento. Ele era agora tão alto como Sirius, então perdera consequentemente boa parte de suas roupas e tênis, essas tinham sido passadas para Julian.
— Ei. — cumprimentou com um sorriso. — Precisando de alguma coisa?
— Não, mas a mãe disse que era para eu te pedir pra entrar. — Julz, como ele era chamado pelos amigos, explicou pacientemente. — Ela fez biscoitos. Almofadinhas chegou a pouco tempo e está perguntando de você.
— Remus? — perguntou o mais velho.
— Mamãe fez cookies com gotas de chocolate. Ele certamente irá aparecer a qualquer instante.
Harry riu levemente e se levantou do balanço de pneu. Nem mesmo ele resistia aos cookies com gotas de chocolate de sua mãe.
Casualmente, seu braço passou sobre os ombros de Julian e os dois caminharam daquele jeito de volta para o chalé mais charmoso da pitoresca Godric’s Hollow. Eles desviavam propositalmente das flores, porque tinham amor a própria vida e porque elas eram extremamente importantes para a Sra. Potter.
E por falar nela, tentando passar despercebida, ela sorrateiramente se aproximou da porta para verificar seus meninos. Sorriu quando percebeu os dois caminharem abraçados de volta para a casa.
Lançou um olhar desconfiado para o horizonte, o que parecia um insulto dado que era um dia tão lindo de verão, mas a Sra. Potter sabia bem que as coisas haviam mudado. Nenhum deles estava seguro, pelo menos não mais.
— Você sempre teve mãos divinas, Lily. — escutou a fala grotesca de um de seus melhores amigos, Sirius Black.
Sirius falava de boca cheia, a barba estava suja de farelos da fornada de biscoitos que ela havia acabado de assar. Lily sorriu satisfeita, embora tivesse estapeado a mão do animago para evitar que ele pegasse outro.
— Você já comeu muito. Os meninos e Remus ainda vão comer. — ela falou com as mãos na cintura e naquele tom mandão.
— Bem... você não vai me negar aqueles pãezinhos de cebola, vai? — Sirius perguntou em seu tom charmoso e familiar. Ele bateu os cílios infantilmente, como se esperasse que a ruiva fosse mesmo negá-lo algo.
A sombra de um riso cruzou os lábios de Lily. Ela tentou esconder o fato por um momento, mas falhou miseravelmente.
Quando a dupla de irmãos chegou ao chalé, o riso de Lily foi a primeira coisa que chamou a atenção de Julian. Aquilo fez o menino feliz. Ele gostava quando escutava a mãe rir daquele jeito e, estranhamente, ela sempre parecia rir mais quando estava ao redor de Sirius.
Nos olhos do caçula Potter, eles pareciam um casal estranhamente adorável. Estranho porque Sirius Black e Lily Potter não poderiam ser pessoas mais diferentes, isto é, o padrinho de seu irmão usava brincos, calça de couro, fumava como um dragão e tinha tatuagens espalhadas por todo corpo, enquanto a mãe deles era uma mulher elegante, de prazeres refinados como ler um bom livro, tomar vinho, sair para jantar e jardinagem.
Por outro lado, eles eram adoráveis justamente por se divertirem tanto ao redor do outro. As pessoas diziam que Lily era a única que conseguia evocar algum senso de responsabilidade e razão em Sirius, Almofadinhas era a única pessoa no mundo que sabia como fazer Lily rir após toda a tragédia em sua vida.
Seria mais óbvio se Lily ficasse com alguém como Remus, seu padrinho, que tinha prazeres tão semelhantes aos dela, mas Julian achava que o pobre Aluado já tinha problemas demais, assim como sua mãe. Ele poderia fazer bom uso de alguém que colocasse mais emoção em sua vida – de um jeito bom, é claro.
— O que é tão engraçado? — Harry quis saber, um sorriso também surgindo em seus lábios.
Aquilo aliviou os presentes de uma maneira geral, já que recentemente era tão difícil conseguir um sorriso de Harry.
No fim do último ano letivo, Harry havia tido uma visão que Sirius e Lily tinham sido capturados por Voldemort. Ao não conseguir entrar em contato com nenhum dos dois, por estarem em missão pela Ordem, Harry se apavorou e acabou indo para o Departamento de Mistérios no Ministério da Magia onde havia visto Voldemort torturar o padrinho e a mãe.
Aquilo resultou numa batalha entre os membros da AD, uma organização formada de estudantes para aprender DCAT, comensais da morte e a Ordem da Fênix. Voldemort também havia aparecido e tivera um confronto com o Prof. Dumbledore. De maluco e mentiroso, Harry havia passado para ‘O Eleito’ – como se O-Menino-Que-Sobreviveu já não fosse ruim suficiente.
— Sua mãe acha que é engraçado me ver implorar por cookies. — Sirius contou em tom extra dramático.
— Você já comeu o suficiente para um esquadrão de aurores!
— Eu só comi três!
A resposta de Sirius veio da lareira quando subitamente o corpo de Remus Lupin apareceu.
— Três vezes três, você quer dizer... — disse Aluado limpando as vestes remendadas de sempre. — Boa tarde a todos!
— Remus! — Julian saudou-o alegremente.
Enquanto Harry sempre tinha o privilégio de ter o padrinho por perto, Julian não sentia que tinha a presença de Remus o tanto quanto gostaria. Ele se apressou na direção do homem esguio e o abraçou com saudades.
Remus o abraçou de volta, visivelmente comovido com a demonstração do mais jovem.
— Você não me abraça assim mais. — Sirius provocou Harry. — Você costumava me dar esse tipo de atenção.
— Sentindo-se carente, Almofadinhas? O que aconteceu com aquela bela senhorita de garras vermelhas que você estava se encontrando no último verão? — Harry indagou levando um biscoito a boca.
Não passou despercebido ao lobisomem o rubor nas bochechas de Sirius e um ligeiro desconforto da parte de Lily. Tanto ele como Julian trocaram olhares suspeitos.
Há meses ele e Julian discutiam em suas cartas que Lily e Sirius haviam construído um relacionamento que para todos os efeitos só não tomava vias românticas devido a uma barreira invisível chamada James Potter.
Aluado conseguia ver claramente que Sirius tinha sentimentos por Lily e vice-versa, mas todos dois pareciam refutar a ideia e jogar os sentimentos para debaixo do tapete porque era mais fácil assim. Porque daí nenhum dos dois precisaria se remoer de culpa por ‘trair’ a memória de James.
— É Almofadinhas... — perguntou Remus com o braço ao redor do ombro de Julian. — O que aconteceu com Meredith?
Sirius o lançou um olhar afiado e perfurante, mas Harry logo soltou uma gargalhada que amenizou a atmosfera do ambiente.
Remus recebeu um abraço caloroso de Lily, que como sempre, estava extremamente bonita, e feliz por recebê-lo. Em seguida foi a vez de Harry, mas como Sirius havia apontado, o menino estava crescendo e se tornando um homem. Ele não dava abraços tão calorosos e enfestados de uma carência mal suprida como o irmão caçula, Harry era mais contido e reservado nas demonstrações de afeto. Estranhamente, nem Lily e nem James eram daquele jeito.
Olhando para Sirius e Harry cochicharem entre si e saírem de fininho, Remus sorriu ao perceber que Harry tinha puxado aquilo de seu segundo pai.
— Você me trouxe o presente?! — Julian perguntou animadamente.
— Julian! — Lily o repreendeu com os olhos arregalados. — Não foi essa a educação que te demos.
Remus riu e apaziguou Lily com um toque fraternal em seu ombro.
— Não se preocupe, Lils. Eu o disse numa carta que traria um presente para ele. — explicou Remus.
Lily ainda não parecia satisfeita com a explicação, ela murmurou algo sobre ir preparar chá para eles e deixou afilhado e padrinho a sós.
Com um olhar sobre o ombro, ela se sentiu imensamente grata aos Marotos. Seu coração transbordou de alegria ao ver Remus tirar o que era uma pedra da lua dos bolsos e colocar nas mãos de Julian. Seu olhar foi mais longe e ela viu através das janelas Sirius e Harry conversarem e dividirem um cigarro no jardim, embora ela repudiasse aquele novo hábito de seu filho.
Ela olhou para a foto de James que estava pregada na geladeira. Certificava-se que sempre tivesse uma foto dele em todos os cômodos possíveis.
— Esta é nossa vida, a nossa família. — murmurou olhando para a foto de seu marido de 22 anos.
22 anos. Merlin. Eles eram tão jovens.
Mas ser jovem não necessariamente significava ser imaturo. James Potter havia demonstrado um profundo senso de responsabilidade ao decidir esconder sua família, mas também um ato de coragem ao decidir que a vida deles era mais importante que a sua – o bebê no ventre de sua esposa merecia nascer, seu filho de um ano merecia viver e eles precisariam de Lily para essas duas coisas.
James Potter não teve medo da morte quando a varinha alcançou aquele ponto de sua testa – onde ficava o terceiro olho, como diria Lily – e recebeu a morte de bom grado, feliz por finalizar o encantamento e dar a chance de sua família viver.
Grandes responsabilidades sobre ombros tão jovens! Não estranhamente, aquilo parecia estar na genética dos Potter. Harry também tinha grandes responsabilidades, mesmo aos dezesseis anos.
Baforando a fumaça, ele confidenciou ao padrinho que sequer conseguia se lembrar da última vez que dormira uma noite inteira.
— Ainda está tendo pesadelos? — Sirius perguntou em tom preocupado.
— Não. — falou olhando para os próprios pés. — Acho que a falta dos pesadelos tem me preocupado mais.
— Já conversamos sobre isso. Não pode ficar sonhando com as coisas que aquele maníaco fala ou faz. — Sirius disse raivoso. — Aprenda a porra da oclumência!
— Fácil falar. — Harry retrucou no mesmo tom. — Eu tentei, ok?! Snape não quer me ver nem pintado de ouro.
Sirius resmungou um palavrão.
Harry se lembrava do padrinho marchando pelos corredores de Hogwarts e dando um soco na cara de Snape no meio de todos os alunos. Ele culpava Snape por Harry não ter aprendido oclumência, o que sem a menor dúvida se devia mais a falta de talento do grifinório que o cancelamento súbito de suas aulas após ser pego xeretando as memórias do professor.
Na mente complicada de Sirius Black, Snape era o culpado de tudo porque Harry não tinha aprendido oclumência porque Snape parara de dá-lo as aulas, por isso Voldemort tinha conseguido entrar em sua mente e implantar uma falsa visão de Sirius e Lily sendo torturados.
— Olha... eu sei que os últimos anos não foram o que chamaríamos de ideal para a nossa família. — Sirius disse em tom mais calmo, provavelmente percebendo que os dois não iriam a lugar algum se exaltassem-se. — Mas eu prometo que há pessoas ao seu lado, Harry. Eu vou fazer o que for preciso para facilitar isso para você.
Harry sabia que o padrinho queria dizer aquilo. Sirius faria absolutamente qualquer coisa por ele.
Sirius havia dado um soco na cara de seu odiado professor de poções, havia se lançado entre ele e Lupin na forma de lobisomem, tinha carregado Harry para a enfermaria após voltar do cemitério no torneio tribruxo e tantas outras coisas. Entretanto, Harry tinha um único pedido ao homem.
— Eu preciso que você me prometa cuidar deles. — Harry suplicou baixinho, olhando de relance para onde Julian, Lily e Remus comiam biscoitos e conversavam empolgadamente. — Cuide deles. Leve-os embora se for preciso.
— Eles nunca abandonariam você, Harry. — Sirius apontou, uma mão repousando em seu ombro. — Confie em mim. Daremos um jeito.
Harry não respondeu de imediato. Ele tragou o cigarro uma última vez antes de se voltar para o padrinho.
— Eu sei. — respondeu o jovem homem com a cicatriz em forma de raio. — É por isso que estou pedindo. Eles jamais me abandonariam, mas nós dois sabemos Almofadinhas que independentemente do que seja, no final, eu estarei por minha conta. Eu preciso ter paz, eu preciso saber que Julian e a mãe ficarão bem. Prometa-me.
A maturidade precoce de Harry o ensinou a olhar com menos ilusão e aceitar as durezas da vida com mais graça – embora alguns confundissem com resignação.
Ele estava preparado para morrer. Morreria de pé, como o pai, com uma varinha entre os olhos e o triunfo sobre algo que era maior que qualquer medo que habitasse seu corpo.
— Eu prometo. — Sirius Black respondeu após um longo momento em silêncio.
Os dois sabiam que Harry não o deixaria em paz até fazê-lo prometer. Sirius cumpria bem suas promessas.
Escutaram Lily gritar que o chá estava pronto e decidiram voltar. Até porque Sirius queria mesmo comer os pãezinhos de cebola que a ruiva havia preparado e pareciam tão frescos e apetitosos.
Quando os dois entraram, Harry foi logo se adiantando para sentar perto de Julian e afanar da mão do irmão, que protestou com um sonoro ‘ei!’, a pedra da lua que Remus havia trazido de presente.
Não sabia se seu semblante denunciava qualquer coisa que tinha discutido com Harry, mas Lily tinha um poderoso sexto sentido. Ela se aproximou e o perguntou baixinho se estava tudo bem.
Sirius sentiu um pouco de pena dela. Podia ver o pânico em seus olhos gentis e amorosos, o pânico característico de uma mãe que não conseguia mais alcançar o próprio filho.
Harry estava se tornando homem e se antes ele já tinha um profundo senso de proteção sobre a mãe e o irmão, nada se equiparava a agora. Ele estava escondendo coisas de Lily, não a dizia sobre os pesadelos, não a contara sobre a habilidade de ofidioglota e não a disse que sabia sobre a profecia que se referia a ele.
— Está tudo bem. — Sirius mentiu descaradamente, também ansioso para proteger a ruiva de mais sofrimento. — Ele só queria ter um papo de homem. Anda muito em dúvida quanto a carreiras e está ansioso para o resultado dos N.O.Ms.
Lily pareceu achar algo bastante plausível e aceitou a desculpa de Sirius.