
A lua cheia derramava sua luz prateada sobre a floresta densa, transformando as árvores altas em sombras escuras que pareciam sussurrar segredos esquecidos. No meio dessa paisagem sombria, uma figura caminhava silenciosamente, o som de suas botas sendo abafado pela vegetação rasteira. Harry Potter, agora com 24 anos, não era mais o garoto que havia sido moldado pelo heroísmo da Ordem da Fênix. As cicatrizes do tempo, da guerra e das escolhas difíceis haviam deixado marcas profundas, tanto em seu corpo quanto em sua alma.
Ele parou perto de uma clareira, o ar úmido e denso de setembro abraçando-o enquanto olhava para o céu. As estrelas cintilavam fracamente acima, mas sua mente estava longe de ali. Ele levou a mão à cicatriz em sua testa, a marca que o tornara famoso desde bebê. Mas não era dessa cicatriz que ele estava pensando naquela noite.
- Você está perdido em seus pensamentos de novo, Potter?
A voz profunda e grave ecoou atrás dele, e Harry não precisou se virar para saber quem era. Walden Macnair. A presença imponente do homem podia ser sentida antes mesmo de suas palavras serem ditas, um predador experiente que parecia se mover com uma precisão assustadora.
Harry sorriu, sem desviar os olhos do céu.
- Talvez. Ou talvez esteja apenas esperando por você.
Walden deu alguns passos à frente, suas botas pesadas esmagando folhas e galhos sob seus pés.
- Esperando por mim ou pelas respostas que você ainda se recusa a aceitar?
Quando Harry finalmente se virou, ele viu Walden parado na beira da clareira, uma figura sombria e ameaçadora, mas com um olhar que poucos reconheceriam como cauteloso. Seus cabelos longos e escuros estavam presos atrás da cabeça, e uma cicatriz profunda atravessava o lado esquerdo de seu rosto, uma lembrança de batalhas passadas.
- Ambos. - Respondeu Harry, com um sorriso melancólico. - Às vezes, as respostas só aparecem quando você para de procurar.
Walden se aproximou lentamente, e o brilho da lua capturou as cicatrizes que cobriam seu rosto e pescoço. Ele havia lutado em inúmeras batalhas, tanto para Voldemort quanto para si mesmo, e sua crueldade no campo de batalha era conhecida por todos. Mas havia mais em Walden Macnair do que o executor brutal da velha guarda dos Comensais da Morte. Havia uma complexidade que poucos entendiam, um homem que tinha suas próprias cicatrizes, internas e externas.
- Você pensa demais, Potter. Sempre pensou. - A voz dele era carregada de exasperação, mas havia um tom de familiaridade nas palavras, quase afetuoso.
Harry deu de ombros.
- E você pensa de menos, Macnair. É por isso que fazemos uma boa dupla.
A tensão que normalmente existia entre os dois parecia suavizar por um momento, como se as cicatrizes invisíveis que ambos carregavam fossem algo que os unia de maneiras que ninguém mais poderia entender.
Eles se conheceram anos antes, em meio à confusão da guerra final. Harry estava mais velho, mais endurecido pelas batalhas e pelas perdas, quando finalmente encontrou Macnair no campo de batalha. Não foi uma luta fácil; Walden era implacável, e Harry, guiado por anos de treinamento e ódio, quase cedeu à escuridão que crescia dentro dele. A cicatriz que marcava o lado esquerdo de seu abdômen, um corte profundo e brutal que Walden lhe infligira durante essa batalha, ainda o incomodava nas noites mais frias.
Mas, estranhamente, aquela luta não terminou em morte. Macnair, mesmo sendo leal a Voldemort, hesitou, e Harry sentiu, pela primeira vez, que o homem que tinha diante de si não era apenas um monstro cego pela sede de sangue. Havia algo mais, uma sombra de dúvida ou talvez de cansaço nas ações de Walden. E foi naquele momento de hesitação que algo mudou.
- Você ainda lembra da nossa primeira luta? - Harry perguntou, sua mão inconscientemente indo para a cicatriz que Macnair havia deixado nele.
Walden olhou para o movimento, seus olhos escurecendo.
- Lembro de cada golpe. Achei que seria o fim de você, e talvez tivesse sido, se eu não tivesse...
- Parado? - Harry completou. - Se você não tivesse hesitado, eu não estaria aqui agora. Talvez você também não.
Macnair soltou um grunhido, mas não havia negação em seu olhar.
- Hesitei porque vi algo em você que não vi nos outros. Você não estava lutando por si mesmo, Potter. Você estava lutando pela sombra de alguém. Isso me fez lembrar de mim mesmo.
Harry riu, mas o som não tinha alegria.
- Curioso, considerando que você sempre pareceu tão devotado a Voldemort. Pensei que fosse incapaz de qualquer coisa que não fosse crueldade.
- Eu sou cruel. - Respondeu Walden, sua voz baixa, mas firme. - Mas todos carregamos nossas próprias cicatrizes, Potter. Algumas são físicas, outras... não.
Os dois homens ficaram em silêncio por um momento, deixando a escuridão da noite envolver suas reflexões. Era verdade, pensou Harry. Ambos tinham cicatrizes que iam além do corpo. As dos Dursley, a indiferença e os abusos silenciosos que haviam moldado Harry em sua infância, e as cicatrizes emocionais deixadas pelas inúmeras perdas que sofreu desde que entrou no mundo mágico. Quanto a Walden, Harry sabia muito pouco de seu passado, mas via em seus olhos a mesma dor profunda, ainda que bem escondida.
- E foi isso que nos uniu, não foi? - Harry perguntou suavemente, quebrando o silêncio. - Nossas cicatrizes. O que passamos e o que nos tornamos.
Walden o encarou por um longo tempo, como se estivesse avaliando cada palavra dita. Finalmente, ele assentiu lentamente.
- Talvez. Mas eu não me engano, Potter. Eu não sou um homem bom. Eu nunca fui. E não sei o que você vê em mim.
- Eu vejo um espelho. - Harry respondeu simplesmente. - Não sou mais o garoto que você encontrou no campo de batalha. A guerra mudou todos nós.
Walden se aproximou, seu olhar penetrante fixo em Harry.
- Então o que você quer, Potter? Por que continua aqui, comigo, sabendo o que sou?
Harry o encarou com intensidade, seus olhos verdes brilhando na luz da lua.
- Porque, Macnair, você é a única pessoa que entende. A única pessoa que sabe o que significa carregar o peso de cicatrizes que nunca vão desaparecer.
Aquelas palavras pairaram no ar por um momento, e então, lentamente, Walden estendeu a mão, tocando a cicatriz no abdômen de Harry, o local onde seu machado o havia ferido anos antes. O toque era leve, quase reverente, mas carregava um peso de memórias e promessas não ditas.
Harry não se afastou. Em vez disso, permitiu-se relaxar sob o toque de Macnair, uma aceitação silenciosa de que as cicatrizes que ambos carregavam eram mais do que marcas de dor; eram símbolos de sobrevivência, de uma conexão forjada no calor da batalha e mantida pela compreensão mútua.
- Somos cicatrizes, você e eu. - Walden murmurou, seus dedos ainda traçando a marca no corpo de Harry. - E sempre seremos.
Harry sorriu, um sorriso melancólico, mas verdadeiro.
- Sempre seremos.