
Fazia quase dois meses desde que a guerra tinha acabado; parecia que uma grande tempestade finalmente estivesse se dissipando. Quando tudo terminou, houve a felicidade inicial, o alívio que veio como um longo suspiro, e a dor, marcadas pelas cicatrizes físicas e mentais. E, claro, teve o luto... O choro, os funerais. Os gritos.
Todos tinham perdido alguém: conhecidos, professores, parentes, padrinhos, amigos. Pais, filhos, netos. Mas o sol se levantou e, junto dele, todos se reergueram. O lugar da batalha, Hogwarts, estava quase completamente reconstruído, suas ruínas agora presentes apenas nas memórias daqueles que participaram daquele dia.
O medo havia desaparecido das ruas desde que os Comensais remanescentes foram presos. Os mortos foram homenageados, os vivos agradecidos, e a vida, enfim, recomeçou.
Mas na sala escura da antiga casa Black, o herói da guerra, Harry Potter, estava sentado em um sofá que conhecera dias melhores, assim como toda sala ao seu redor, desbotada pelo tempo. Seu cabelo preto, desgrenhado como crisântemo, destacava-se na luz fraca. Ele refletia sobre como o Voldemort já havia morrido e mesmo que indiretamente, ainda era a causa dos seus problemas.
O único motivo para Harry estar bocejando, em vez de dormindo, era a mulher à sua frente, com uma expressão constante de aborrecimento. Seus olhos violetas, intensos, pareciam enxergar diretamente a alma dele.
“Recebeste minha carta, Harry?” ela perguntou, a voz cansada, já prevendo a resistência do garoto. Seus cabelos loiros platinados caíam suavemente em seu rosto quando ela inclinava a cabeça levemente para o lado.
“Claro, mas quer saber, Morana? É brilhante que o tempo passa e você ainda é uma bela mulher de 35 anos!” zomba o rapaz, com seus olhos verdes brilhando em diversão.
“Sinto informar-te, mas minha aparência depende exclusivamente de ti, criança,” disse a entidade de forma austera, mas logo um pequeno sorriso surgiu ao ver surpresa no rosto do garoto.
“Se você diz...” Harry tenta falar de forma indiferente, mas sua voz ainda mantinha sua surpresa. “Qual é o verdadeiro motivo por trás disso? Não me parece que a vossa senhoria esteja fazendo isso sem nenhum motivo além de bondade.” Ele fala, com seu semblante se tornando sério, parecendo finalmente tomar a iniciativa para a conversa.
“Tenho meus motivos, criança. E talvez um deles seja tédio. Anseio por um lugar onde possa passar os próximos anos de maneira interessante. Um lugar movimentado, e vós, com toda a vossa confusão, promete ser divertido. Estou certa de que será fascinante assumir o papel de vossa mãe enquanto tentais lidar com um Lorde das Trevas adolescente.” Diz ela lentamente com um sorriso zombeteiro, revelando um toque de sadismo.
A mandíbula de Harry se contrai e ele salta do sofá, gritando. “Então eu vou servir a vossa alteza como um passatempo? Além de salvador da bosta do mundo mágico, agora sou um simples brinquedo para você?” ele levanta as mãos exasperado, e esfrega o rosto na tentativa de se acalmar, mas acaba se afundando no sofá, com uma respiração ofegante.
“Você não é um ‘brinquedo’ para mim, criança”, diz ofendida.
“Entenda, Morana, eu não acho que estou pronto para lidar com outro Lorde das Trevas, mesmo que seja um mirim.” Ele diz frustrado lembrando com quem estava falando. “Isso não deveria ter acabado com o fim da guerra?”, diz mais calmo, mas ainda carrancudo, enquanto pega um pequeno urso de pelúcia que estava escondido na beira do sofá.
“Isso não vai acabar por pelo menos alguns anos Harry.”
Após um breve silêncio tenso, o jovem se levanta novamente e começa a andar, segurando firmemente o pequeno urso em sua mão. “Cara, eu mal consigo cuidar de mim mesmo. Se não fosse o Monstro, não sei nem se daria conta de cuidar deles...” Diz serrando a mandíbula. “Agora você quer acrescentar estudar, socializar e lidar com o maldito Tom Riddle! Caramba, eu vou perder todos que eu amo, Morana!”, diz, passando a mão pelo cabelo e puxando alguns fios. “Eu me assusto com sons altos, Morana! Com sons! Como eu faria isso? Me agarrar com força a ele quando alguém derrubar um caderno?”
“Harry, não precisarás lidar com ele de imediato. Podes aproveitar algum tempo tendo uma vida escolar normal; aposto que isso te agradaria,” diz Morana com simpatia, observando o garoto de pé com um brinquedo passando de uma mão para outra como se fosse uma bola.
“Talvez isso fosse interessante no ano passado. E, mesmo que eu estivesse interessado, o que não estou, acabaria tendo que lidar com Tom Riddle uma hora ou outra. E já tem um monte de bosta no meu ombro para acrescentar mais a lista. Eu não dou conta de lidar com a versão mais jovem de Voldemort, Morana, ele, tendo ou não uma alma intacta,” a mulher o observa enquanto Harry solta um suspiro cansado e se senta novamente. “Além do mais, agora tenho o Teddy e a Delphi.”
“Eu sei Harry, mas você não estaria sozinho. Teria a mim.” O garoto não responde, só observa o ursinho de forma frágil, parecendo uma criança que precisa de apoio. Até que o silêncio é quebrado.
O choro de um bebê, invade rapidamente o ouvidos dos dois, que fazem uma leve carreta, que se torna maior quando o choro se torna dois muito rapidamente, quebrando o silêncio desconfortável que pairava na sala.
“Desculpe, a Delphine está com cólica, e o Teddy sempre chora quando ela o faz,” diz o garoto, se levantando e indo em direção ao quarto dos bebês.
“Agora entendo por que estás exausto. Eles choram alto.” Diz a mulher, em um tom que tenta ser leve.
“Não fale deles, eles são meus filhos. E se você quiser pode ir embora.” Harry responde de forma grossa e seca.
“Não se preocupe, estou logo atrás de você. Não irei embora por causa de um chorinho.” Responde Morana, suavizando as palavras. Contudo, ela lança um leve feitiço de abafamento em seus ouvidos e segue o jovem.
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Morana observa um quarto branco, que contrasta nitidamente com o restante da casa. Dois berços estão posicionados lado a lado, prontos para se unirem à noite, permitindo que os bebês durmam juntos. O ar no cômodo é preenchido com o suave aroma de talco, bergamota e lenços umedecidos, envolvendo a mulher em um sentimento de aconchego e calmaria.
O berço da Delphine em um tom verde menta, exibe detalhes em prata e branco. Nela repousa uma cobra de pelúcia verde, do mesmo tom dos olhos da pequena, e por brincadeira do destino, a mesma cor de olhos do responsável pela jovem. Morana sorri ao perceber essa ironia, já que Voldemort jamais aceitaria que sua filha fosse criada por Harry Potter.
O berço ao lado é uma combinação de branco, prata e laranja e adornando com um lobo branco de pelúcia, que representa os pais de Teddy.
Morana, cercada pelo silêncio acolhedor do quarto, sentiu uma tranquilidade inesperada ao observar aquele cenário, onde duas crianças, de histórias tão diferentes, de lados opostos agora compartilhavam um espaço comum.
O quarto não era apenas acolhedor, mas também funcional. Duas cômodas estavam abarrotadas de roupas e acessórios infantis, uma para cada bebê. Ao lado, um trocador estrategicamente posicionado facilitava a rotina. Um tapete felpudo cobria o chão, suavizando o espaço, e uma porta prateada dava acesso ao banheiro. Dentro, uma banheira mágica se enchia sozinha com um simples toque, pronta para banhar as crianças.
Harry havia deixado alguns de seus itens por lá também, o que indicava que dormir no quarto dos pequenos era uma ocorrência frequente. E, com dois bebês para cuidar, essa proximidade se tornava não apenas prática, mas essencial. Morana olhava com carinho todos os detalhes, que refletiam a rotina e o cuidado que Harry.
Harry se aproxima do berço de Teddy primeiro, acalmando o bebê e verificando a fralda no processo. Ele nota que o pequeno, ainda agitado, está mudando a cor do cabelo rapidamente – de verde floresta a vermelho cereja e, em seguida, para caramelo. Depois se volta para Delphine, que não está se acalmando tão facilmente.
“Morana, você pode transfigurar uma bolsa de água morna para a Delphi? Ajuda com a dor,” pede o rapaz enquanto passa um pomada em movimentos circulares na barriga da garotinha, que ainda tinha lagrimas nos olhos. Ele observa Teddy no berço, que balança as pernas e os braços, quanto faz pequenos sons de protesto.
“Mestre, se não sabes fazer isto sozinho, és incompetente,” diz Morana entregando o antigo bloco de notas, para o rapaz. Harry apenas revirou os olhos e não respondeu, conferindo a temperatura antes de colocar a bolsa de água na barriga da bebê. “Se quiseres, posso ensinar-te magia sem varinha.” Acrescenta a mulher.
“Você poderia?” O jovem exclama, incrédulo, virando-se bruscamente para Morana ao vê-la confirmar com a cabeça. “Eu adoraria, Morana, obrigado. E só para você saber, posso sim transfigurar, mas tenho você para fazer isso.”
A mulher revira os olhos e resolve não comentar que o jovem sequer tinha uma varinha no momento, já que deixou a sua na sala na pressa de ver os bebês.
Após ambas as crianças se acalmaram, Harry entrega Delphine para Morana, pega o Teddy e seguindo em direção ao banheiro. A mulher se pergunta como é vista pelas crianças, especialmente quando nota que a bebê está estranhamente fascinada, enquanto o irmão a olha um pouco assustado.
Nos momentos seguintes, um Harry Potter está dando banho em um garotinho com cabelos azul-celeste e a própria Morte lidando com uma bebê risonha, que agora, sem dor, acha divertido puxar os cabelos da entidade enquanto o irmão brinca na água, mesmo que Delphine ainda esteja com a fralda toda mijada..
“Monstro!”
Com um pop, o elfo doméstico aparece, soltando resmungos baixos.
“Mestre Harry, como Monstro pode servi-lo?”
“Traga uma fralda para o Teddy e para a Delphine.”
Mostro revira os olhos, mas desaparece do banheiro. Enquanto o Harry pega seu filho, enrola-o em uma toalha macia e vai em direção ao trocador.
Outro pop soa, anunciando a chegada do elfo, segurando as fraldas, creme para assaduras e talco.
“Monstro trouxe o que o mestre Harry pediu,” disse o elfo, exibindo os itens de maneira zombeteira. “Monstro deveria ser quem cuida das crianças, mas é claro, que a senhora Weasley acha que os bruxos deveriam se sujar com isso.”
“Obrigado, Monstro por trazer tudo que eu precisava,” responde o garoto, passando a pomada e o talco, com naturalidade, enquanto coloca a fralda na criança, prestando mais atenção nos filhos, do que escutando as reclamações do Elfo.
“Tu realmente te importas com eles,” afirma a Morte.
“É claro que me importo com eles. Eu os amo, mesmo que boa parte do mundo mágico me ache muito novo para cuidar de um par de bebês de menos de um ano,” diz Harry, enquanto pega sua filha do colo da loira e entrega o pequeno Teddy à entidade, que se agita no colo da mulher.
“Como teus amigos reagiram?” pergunta, tentando manter a criança no seu colo.
“Ron levou um tempo para aceitar, mas Hermione o convenceu. A senhora Weasley veio todos os dias na primeira semana para me ajudar com os eles. Ter dois bebês é complicado, e, como pai solteiro de primeira viagem, eu não sabia onde estava me metendo. Não sei como agradecer a ela; sem a ajuda dela, eu teria me perdido,” diz Harry, colocando Delphine na banheira e lançando um feitiço para que ela fique sentada e não escorregue para debaixo d’água.
"Sabe, sou muito grato pelo apoio que recebi, e agradeço a você também, Morana, por me permitir cuidar da minha pequena serpente. Às vezes, fico pensando como teria sido se nunca a tivesse conhecido ou se ela crescesse sozinha, sem ninguém que realmente se importasse. Não quero que ela repita o que aconteceu com seu pai."
"Eu nunca pensei que você, meu senhor, me agradeceria por várias noites sem dormir, fraldas para trocar e todo o dinheiro gasto em leite e talco," Morana comenta, observando o jovem sorrir enquanto começa a lavar o cabelo da bebê. "Sabe, se você decidir ir, posso arranjar para que o diretor Dippet permita que esses pequenos o acompanhem à escola." Harry revira os olhos, mas acaba mordendo a isca.
“E qual será meu sobrenome lá?” pergunta o garoto enquanto termina de lavar o cabelo loiro da pequena. Ele tenta tirá-la da banheira, mas a criança protesta, querendo brincar mais na água, estão ele a enrola em uma toalha fofinha, enquanto ela se balança para voltar a água.
“Tu, criança, serias meu filho.” Morana diz, enquanto Harry se vira bruscamente para ela.
“Eu seria seu filho? Pensei que era brincadeira quando você falou isso antes.”
“Sim, serias, não é brincando. Parece que não queres,” ela responde.
“Não! Só não esperava... Eu, filho da Morte? Quem diria,” comentou o jovem, enquanto secava sua filha, que ri alegremente, pelas cocegas
A mulher observou enquanto a bebê já estava com a fralda e se aconchegava no colo do pai. “Teu sobrenome será Peverell, um velho amigo insiste que eu o use.”
“Mas, sendo um dos Sagrados 28 e uma família extinta, como vou usar esse sobrenome?” perguntou, enquanto pegava Teddy no colo, junto com Delphi, que já começava a cochilar, não prestando tanta atenção a conversa mais focado nos bebês.
“Bem, eu posso gostar de brincar com o tempo, já que passo muito dele entediada, e posso ter uma história completamente montada. Mas não sei se tu, mestre, gostarias dela,” diz um pouco sem jeito. O jovem fica dividido entre curiosidade e medo, enquanto levava os bebês para seus respectivos berços, onde eles já estão começando a cochilar.
“Vamos voltar para a sala para conversar sobre,” Ele sussurra então se move para sair do quarto. Após isso, uma longa conversa se pode escutada ao longo da casa Black, culminando em uma exclamação que parecia muito com “Por que acho que vou me arrepender disso?