
Como se o mês de dezembro não fosse suficientemente insuportável com a sua avalanche de neve, decorações festivas e um Salão Principal adornado com mais azevinho do que qualquer bruxo poderia tolerar, o universo decidiu que Severus Snape não estava sofrendo o bastante.
— Infelizmente, o professor Hawthorne está sofrendo de varíola de dragão, o pobre homem. — anunciou Minerva McGonagall em uma destas reuniões inúteis de equipe.
Imediatamente, Severus soube que algo terrível estava por vir.
Não era a primeira vez que a diretora agia como o destino encarnado, pronta para infligir mais sofrimento a ele. Mas é claro, naquele dia ela estava ainda mais diabólica.
Minerva abriu um sorriso satisfeito que poderia muito bem ter sido ensaiado por semanas na frente do espelho.
— Eu, é claro, convidei uma professora substituta. — ela continuou. — Heather Potter aceitou substituir o nosso professor durante o mês de dezembro.
A reação foi instantânea. A equipe do corpo docente explodiu em aplausos, sorrisos radiantes e murmúrios de aprovação, como se Minerva tivesse acabado de declarar um aumento de salário.
Enquanto isso, Severus, sentado em seu lugar habitual — o mais distante possível de qualquer coisa remotamente alegre —, chegou a uma única, inescapável conclusão: a sua morte prematura estava sendo meticulosamente planejada pela diretora de Hogwarts.
Não havia outra explicação para essa decisão. Trazer Heather Potter para invadir o seu espaço de trabalho era um ato de guerra pessoal. E os aplausos em torno dele só tornavam a coisa toda ainda mais insuportável.
Ele poderia ter protestado, é claro. Poderia ter apontado a total inutilidade de um professor substituto para Defesa contra as Artes das Trevas, especialmente quando o professor original era completamente inútil mesmo saudável.
Mas para quê? Minerva já tinha vencido esta batalha, e todos ao redor estavam prontos para celebrar o triunfo como se, a julgar pelas expressões, ela tivesse anunciado a volta de Merlin para o mundo bruxo.
Apenas três semanas, Severus pensou, tentando se convencer de alguma verdade oculta.
Vinte e um dias de tormento.
Nada que ele não pudesse suportar... desde que, é claro, não houvesse muita proximidade.
Mas, ao olhar para o sorriso satisfeito de McGonagall, ele sabia que isso era pedir demais.
Ele já estava condenado.
❄❄❄❄❄
O dia seguinte, portanto, começou como qualquer outro: insuportável.
O Salão Principal brilhava de forma ofensiva, decorado com aquelas malditas árvores de Natal que Hagrid havia arrastado da floresta e, como se não bastasse, o teto estava encantado para despejar neve falsa todos os dias até o feriado.
Um maldito pesadelo festivo.
Os alunos, como sempre, já estavam tagarelando em seus lugares. Algo sobre um baile de natal? De todas as ideias ridículas que Minerva poderia conceber, esta era, sem dúvidas, a pior. Com certeza, o retrato de Albus tinha algo a ver com isso.
Severus Snape, em seus trajes escuros e o humor de uma pessoa nada matinal, tomava o seu chá preto lutando contra o impulso de deduzir pontos só pela irritação. Não havia quantidade suficiente de cafeína no mundo para fazê-lo suportar isso.
E, para piorar tudo, Potter abriu a porta do Salão Principal em um rompante, fazendo com que cada cabeça virasse em sua direção e o volume dos sussurros subisse em um nível alarmante.
— É ela, não é? Quero dizer, ela é ainda mais bonita pessoalmente do que no Semanário das Bruxas.
— Ouvi dizer que ela salvou um bando de unicórnios na semana passada.
— Eu ouvi que ela recusou o cargo de Ministra da Magia. Ela é tão humilde.
Como sempre, sem nem mesmo tentar, ela era capaz de capturar a atenção de cada bruxo e bruxa sem fazer o menor esforço. Era um talento realmente — e, para a irritação de Severus, ela parecia totalmente alheia ao próprio impacto.
Ela estava vestida com as suas roupas de auror, o traje escarlate ajustado ao seu corpo que acentuava a sua cintura de uma maneira bastante pertubadora. O casaco de couro marrom bem cortado e a capa pesada pareciam, de alguma forma, ainda mais adequados. Os seus cabelos negros estavam presos em uma trança lateral, com alguns fios soltos que brilhavam sob as luzes natalinas do salão. Ela andava com aquele tipo de elegância quase irritante, cada passo perfeitamente medido, o tipo de andar que falava de alguém treinado e confiante. Era o tipo de postura que fazia com que o salão inteiro se inclinasse em sua direção, sem que ela precisasse lutar por isso.
Mas, é claro, não era como se Severus Snape estivesse prestando atenção nela.
— Bom dia, Heather, querida. — Minerva gorgolejou, quase saltando da cadeira. — Muito obrigada por ter aceitado substituir o professor Hawthorne tão em cima da hora. Fico feliz que o Departamento de Aurores liberou você!
— Não precisa agradecer, Diretora McGonagall. Eu fico feliz em ajudar!
— Oh, me chame de Minerva, querida.
— Seja bem-vinda, Heather. — Sinistra acenou com uma mão.
— Heather, que ótimo ver você novamente. — Flitwick ergueu-se de seu banco com um entusiasmo desproporcional, que quase fez Severus revirar os olhos. — Eu estava ansioso pela sua chegada.
— Heather, bom ver você novamente. Seja bem-vinda. — Longbottom levantou-se da cadeira e a recebeu com um abraço apertado.
— Obrigada, Neville. É muito bom estar de volta.
— Como estão as coisas? Alguma novidade para compartilhar? — Ele perguntou, erguendo uma sobrancelha.
— Ah, bem, está tudo bem, nenhuma novidade. — Ela abriu um grande sorriso, enquanto Severus observava a cena com os olhos semicerrados, claramente irritado.
— Bom, é bom ter você de volta, Heather. Se precisar de algo, sabe onde me encontrar!
— É claro, Nev. Obrigada!
Até Trelawney, que parecia sempre em outro plano de existência, tirou os óculos de leitura e olhou severamente para Heather.
— Ah, sim… Eu vi que você chegaria esta manhã…
Severus bufou, sem conseguir se segurar.
— Claro que sim, sua mulher ridícula. Fomos avisados na reunião de professores.
Como esperado, Trelawney nem sequer olhou para ele, apenas fez uma cara de quem acabara de ter uma visão profunda sobre seu destino e enfiou a colher cheia de mingau na xícara de chá.
— Bom dia, Severus. — Heather parou bem ao lado dele, com aquele sorriso imperturbável.
— Potter. Vejo que você não mudou nada.
— Ora, obrigada, Severus.
— Não foi um elogio.
Ela soltou uma risada divertida e puxou a cadeira ao lado dele, sentando-se completamente à vontade.
— Então, você é a famosa Heather Potter, não é mesmo? — Um dos professores se inclinou sobre a mesa com um sorriso largo. — Eu sou Marcus Runcorn, professor de Estudo dos Trouxas, ao seu dispor.
— Professor Runcorn, é um prazer conhecê-lo. — Heather ergueu o braço para apertar a mão estendida de Runcorn, quando ele puxou a mão dela para um beijo estalado e molhado em seus dedos.
Severus apertou a sua xícara com força suficiente para deixar a sua pele esbranquiçada.
— O prazer é meu. Pode me chamar de Marcus, é claro.
— Claro, Marcus. — Heather concordou, enquanto Severus lançava um olhar gélido e mortal para o professor maldito, que o ignorou completamente. — Por favor, me chame de Heather.
— Eu estou disponível para ajudar você a se acostumar com a rotina. Eu sei que tudo pode ser um pouco demais nos primeiros dias. — Ele piscou com um olho só, o que claramente era uma tentativa de flerte.
E Severus não estava suportando mais.
— Professor Runcorn, por favor, mantenha o seu entusiasmo dentro da sala de aula. — Severus disse, sua voz fria e venenosa. — Algumas pessoas estão tentando não vomitar no café da manhã.
Heather lançou um olhar divertido para Severus, antes de se virar novamente para o professor Runcorn.
— Eu agradeço a sua oferta, Marcus. Vou ter certeza de me lembrar disso.
Marcus, sem perceber os punhais invisíveis lançados em sua direção, simplesmente acenou com a cabeça, aparentemente satisfeito com qualquer objetivo que ele estava mirando, o idiota.
Severus só queria um fim de ano em paz. Era realmente pedir demais?
❄❄❄❄❄
A resposta, aparentemente, era sim.
O universo, com o seu humor particularmente cruel, achou por bem transformar as semanas que antecediam as férias de inverno em um espetáculo de humilhação pessoal para Severus Snape.
Ele não pediu muito — apenas um pouco de paz, um ou dois momentos de silêncio antes que a avalanche de festividades e crianças histéricas o soterrasse.
Mas, claro, isso era pedir demais.
A primeira semana de Heather Potter no castelo foi, para ele, um desastre de proporções épicas. Não porque ela estivesse fazendo algo particularmente irritante — bem, não mais do que o habitual —, mas porque o mundo parecia incapaz de deixar a mulher em paz. Alunos, professores, funcionários e até mesmo os elfos domésticos a cercavam como se ela fosse uma espécie de divindade.
E, por algum motivo, ele sempre acabava perto para presenciar esse absurdo.
Cada vez que Severus entrava em um corredor, lá estava ela. Ora sendo parada por um grupo de alunos que precisavam desesperadamente saber como era ser uma Auror, ora escutando algum discurso prolixo de Flitwick sobre algum feitiço. Ele até a flagrou nos jardins, em uma conversa animada com Hagrid, enquanto caminhavam ao redor daquelas abóboras horrorosas.
Era um espetáculo interminável de "Oh, Heather, como vai você?" e "Heather, é verdade que você lançou um patrono corpóreo aos 13 anos?" e “Heather, como você venceu um dragão aos 14 anos?” E Potter, com aquela paciência irritante e aquele sorriso educado, respondia a todos, como se fosse a melhor coisa que poderia estar fazendo com seu tempo.
E ele?
Severus Snape, um homem que sobreviveu à guerra, ao Lorde das Trevas e ao pior: o ensino de adolescentes hormonalmente desequilibrados, queria pular da Torre de Astronomia.
Ou jogar alguém de lá.
O fato de que ele não fez nenhum dos dois só poderia ser atribuído a um autocontrole que ele suspeitava estar sendo testado por algum deus particularmente sádico.
O pior de tudo era que ele não conseguia evitá-la. Não importava para onde fosse ou o quão meticulosamente ele calculasse os seus movimentos, ela estava lá.
E então havia Marcus Runcorn.
O ridículo professor de Estudo dos Trouxas tinha decidido que a melhor maneira de ajudá-la a "adaptar-se à equipe de Hogwarts" era colar em Potter como uma planta trepadeira desesperada por luz. Cada comentário excessivamente simpático, cada risadinha inadequada de Runcorn, era um lembrete constante de que o universo realmente queria ver Severus perder a compostura.
Ele até ousou chamá-la de "querida" no meio do Salão Principal. Em voz alta.
Severus, é claro, ignorou tudo isso com o rosto impassível, afinal, não era como se ele se importasse.
Quer dizer… ele, pelo menos, tentou ignorar.
Porque, como se já não fosse insuportável ter Heather por toda parte, ela também apareceu em sua própria masmorra.
Na quinta-feira, ela decidiu surgir de surpresa em uma de suas aulas de Poções. E foi aí que Severus teve a confirmação de que estava, de fato, condenado.
— Severus? — Ela empurrou a porta sem bater, porque, é claro, ela era uma idiota. — Opa, desculpe professor Snape. Eu achei que a aula já havia acabado.
— Srta. Potter. — Ele enunciou cada palavra com precisão cirúrgica. — Se você fosse capaz de interpretar os horários das aulas com a metade da eficiência com que você invade os lugares sem ser convidada, saberia que ainda estamos no meio da lição.
Heather apenas sorriu.
— É claro, peço desculpas, professor. — Ela respondeu, recostando-se na porta como se fosse dona do lugar.
Enquanto isso, os alunos curiosos, ávidos por uma boa fofoca e sempre prontos para se distrair, interromperam o seu trabalho para assistir a conversa.
— O que você quer, Potter?
— Pomfrey pediu para eu buscar algumas poções para a ala hospitalar. — Ela se afastou da porta, para se aproximar da mesa de Severus. — Mas, claro, eu não quis interromper a sua aula.
— E, no entanto, aqui está você. Interrompendo.
— Ah, não seja tão duro comigo, Severus.
Ele apenas revirou os olhos, resignado com o seu destino amaldiçoado.
— Espere aqui e tente, por Merlin, não transformar a minha sala na Torre da Grifinória.
— É claro, Severus. Eu sempre me comporto, você sabe disso.
Severus não respondeu, e, alguns minutos depois, entregou a ela um conjunto de frascos com mais força do que o necessário.
— Aqui estão. Agora, se puder nos poupar da sua presença, seria altamente apreciado.
— Muito obrigada, Severus, você é muito gentil. — Ela piscou para ele.
— Vá embora, Potter. Antes que eu decida incluí-la na lista de detenção desta noite. Eu ainda posso fazer isso.
Ela deu um passo para trás, ainda com aquele maldito sorriso.
— Obrigada novamente, Severus. Vejo você no almoço.
E com isso, ela se foi, deixando Severus com uma sala cheia de alunos cujos olhos brilhavam de curiosidade.
— Por acaso, a entrada dramática de Potter afetou a sua capacidade de seguir instruções? — Ele disse, bruscamente, virando-se para a turma. — Voltem ao trabalho.
Severus bufou e voltou a circular na sala de aula, tentando ignorar os últimos minutos.
Condenado, realmente condenado.
❄❄❄❄❄
Na segunda semana, foi Severus quem interrompeu a aula de Potter. Afinal de contas, a vida dele era um exercício interminável de ironias cósmicas.
Desta vez, ele se viu marchando pelos corredores até a sala de Defesa contra as Artes das Trevas, a pedido de Minerva, para entregar uma caixa com poções de cura, pois os alunos estavam treinando feitiços que poderiam causar ferimentos leves.
Como se ele não tivesse nada para fazer.
Então, lá estava ele, a caminho da sala de Potter, a capa esvoaçando atrás de si, como um mensageiro irritado em uma missão particularmente inútil. Quando chegou ao destino, ele já estava arrependido de ter saído das masmorras.
Sem bater, porque bater era para quem tinha paciência — coisa que ele não possuía no momento —, ele empurrou a porta e entrou.
— Professora Potter.
Heather parou no meio da sua explicação, virando-se lentamente, e um sorriso surgiu em seu rosto.
— Severus! Que surpresa agradável.
— Sim, porque eu vivo para agradar.
— Algo em que eu possa ajudar, ou você veio apenas iluminar a minha aula?
Ele ignorou a provocação, dando alguns passos até a sua mesa e jogando a caixa com irritação.
— Minerva achou por bem que você precisasse disso para a sua… aula. — Ele enfatizou a palavra “aula” com o maior desprezo possível.
Heather olhou para a caixa e depois para ele, inclinando a cabeça.
— É muito gentil da sua parte vir me entregar as poções pessoalmente, Severus. Eu agradeço.
— Não é como se eu tivesse tido escolha. — Ele murmurou.
Os alunos estavam claramente divididos entre o constrangimento de assistir a troca de farpas e o prazer absoluto de testemunhar uma fofoca em primeira mão.
Heather apenas alargou o sorriso, enquanto ele estreitava os olhos para ela, mas qualquer resposta foi interrompida por um estalo alto na parte de trás da sala, seguido por uma explosão de fumaça.
— Senhor Thorne! — Heather girou rapidamente, apontando a varinha para dissipar a bagunça. — Eu disse para não lançar nenhum outro feitiço. Menos dez pontos para a grifinória.
— Potter, sua sala está começando a parecer o meu laboratório nos dias ruins.
— Oh, eu não sabia que você tinha dias bons, Severus. — Ela respondeu sem perder o ritmo, enquanto ainda controlava o caos causado pelo aluno.
Os outros alunos riram, embora abafassem rapidamente, e Severus lançou um olhar gelado para a sala inteira.
— Muito bem. Já fiz o meu trabalho heróico do dia. Se precisar de outra entrega, Potter, por favor, mande alguém que se importa. — Ele virou-se dramaticamente, a capa esvoaçando atrás de si em um movimento elegante.
Ao sair da sala, Severus concluiu que a sua semana continuava provando ser tão insuportável quanto a anterior.
E, claro, tudo por culpa de Potter. Como sempre.
❄❄❄❄❄
Na terceira semana, Severus estava a um passo de pedir demissão.
Como se não bastasse toda aquela decoração, Hogwarts parecia ter entrado em um frenesi insuportável à medida que o baile de natal se aproximava.
No entanto, o verdadeiro tormento era conseguir andar pelo castelo sem encontrar Potter sendo parada por alguém que, invariavelmente, tinha uma única intenção: convidá-la para o baile.
Na segunda-feira, ele a viu no corredor do segundo andar, cercada por um grupo de alunos da Lufa-Lufa. Um dos garotos, com as orelhas tão vermelhas quanto tomates, balbuciava algo sobre ser uma honra levá-la ao baile.
Heather sorriu gentilmente e recusou com uma delicadeza que fez o garoto quase tropeçar em suas próprias palavras.
Na terça-feira, ele estava no Salão Principal durante o café da manhã quando um garotinho magricela do primeiro ano da Grifinória, sim, um primeiro ano , tropeçou até a mesa dos professores com uma flor que claramente tinha sido roubada das estufas de Longbottom.
— Professora Potter, você gostaria de ir ao baile comigo? — o garoto perguntou com um entusiasmo que fez Severus revirar os olhos dramaticamente.
Heather piscou, surpresa, mas conseguiu manter um sorriso caloroso.
— Oh, isso é muito gentil da sua parte, mas eu acredito que você deveria ir com alguém da sua idade, querido.
O garoto saiu de lá vermelho e levemente humilhado, mas ainda sorrindo como se tivesse ganhado a Taça das Casas. Nojento!
Na quarta-feira, ele flagrou um grupo de alunos da Corvinal discutindo abertamente no corredor sobre qual deles teria mais chances de conseguir um "sim" de Potter. Quando ela apareceu, um deles se adiantou, segurando um pergaminho onde claramente tinha ensaiado o seu pedido.
— Professora Potter, eu ficaria honrado se pudesse acompanhá-la ao baile.
Heather abriu um sorriso, mas havia um traço claro de diversão em sua expressão.
— Isso é muito gentil, mas não acredito que seja adequado convidar a sua professora, Sr. Smith.
E, finalmente, na quinta-feira, um dia antes do baile, veio o golpe final. Ele estava no jantar, tentando ignorar o alvoroço ao redor de Heather, quando viu Marcus Runcorn se aproximando.
Severus viu a uma milha de distância o que ele estava prestes a fazer.
— Heather! — Runcorn exclamou com entusiasmo. — Eu estava pensando...
— Isso deve ser difícil para você. — Severus murmurou em voz baixa, mas o suficiente para que Minerva, sentada ao lado dele, engasgasse com a sua bebida.
— ...Se você já tem companhia para o baile. Se não tiver, eu ficaria absolutamente honrado em acompanhá-la.
Heather olhou para ele com um sorriso educado, mas havia algo em sua expressão que Severus reconheceu como exaustão.
Quem diria que as celebridades também ficavam exaustas da atenção, não é mesmo?
— Oh, Marcus, isso é muito gentil, mas eu não acho que vá ao baile com ninguém.
— Ora, mas uma mulher como você não pode ir sozinha! — insistiu Runcorn, sem perceber o tom claro de rejeição.
Severus colocou o garfo na mesa com tanta força que o barulho fez Minerva pular.
— Talvez, Runcorn, você devesse usar o seu tempo para tornar as suas aulas mais úteis, em vez de atrapalhar o jantar dos outros professores.
Runcorn virou-se para encará-lo, parecendo surpreso.
— Ora, ora, Snape… se eu não o conhecesse bem, até diria que você está com ciúmes.
Severus congelou, sentindo o calor subir ao seu rosto.
— Não seja ridículo. — Ele retrucou.
— Eu estou sendo ridículo mesmo? Ou será que você está assim, porque ainda não tem um par para o baile?
— Por acaso, eu já tenho um par, Runcorn.
Potter, que até então parecia estar lidando com a situação com um sorriso educado, quase derrubou o copo de suco de abóbora ao girar bruscamente na cadeira para encará-lo.
— O quê?!
Severus manteve a expressão neutra, embora o pânico começasse a fervilhar em seu peito.
— Algum problema, Potter?
Ela piscou, atordoada, ainda processando a informação.
— Eu só… quem é?
— Isso não é da sua conta, é? — Severus cortou, rápido demais, voltando a se concentrar em seu prato.
Heather não respondeu de imediato, mas ele sentiu o peso do olhar dela em sua direção.
— Claro que não é da minha conta. — Ela repetiu lentamente.
— Bem, Heather, talvez você tenha que aceitar que não é a única pessoa em Hogwarts que atrai tanta atenção. — Runcorn piscou para ela, e Heather lançou-lhe um olhar que poderia ter congelado o Lago Negro.
— Você está certo, Marcus. — Ela respondeu com um tom doce demais para ser verdadeiro.
Severus, que estava tentando se concentrar em não entrar em colapso ali mesmo, percebeu que as coisas estavam saindo de controle rapidamente e ele precisava corrigir isso.
— Se já terminamos de discutir minha vida pessoal, eu gostaria de jantar em paz. — Ele retrucou um pouco áspero demais.
— E, então, Heather? Aceita o meu convite? — Marcus mudou de assunto, ainda insistindo em levar Potter como acompanhante.
— Marcus, eu realmente aprecio o convite, mas eu realmente não pretendo ir com ninguém para o baile. — Ela ajeitou a cadeira e se levantou rapidamente. — Agora, se me dão licença, eu preciso corrigir algumas redações antes do baile de amanhã. Uma boa noite a todos.
Sem esperar por uma resposta, ela se afastou com passos rápidos, deixando um rastro de silêncio para trás. Marcus a acompanhou com os olhos até ela sair do Salão Principal, e depois se recostou na cadeira com um suspiro sonhador e fez metade dos professores revirar os olhos.
Severus, com o maxilar tenso, fixou-se no prato para evitar cometer um assassinato.
❄❄❄❄❄
A noite do baile chegou mais cedo do que Severus gostaria.
Ele vestiu as suas roupas de gala com a mesma expressão de quem está indo para Azkaban, os seus passos ecoando pelo corredor escuro, enquanto se dirigia para o Salão Principal.
Ao chegar, ele se posicionou perto da parede, observando os alunos, vestidos com roupas pomposas, com um olhar de desdém. Ele teria preferido qualquer coisa a estar ali.
E então, como se o universo estivesse apenas esperando o momento perfeito para tornar a sua vida ainda mais miserável, Runcorn se manifestou ao seu lado com um sorriso largo e um copo de ponche na mão.
— Severus! — Ele exclamou. — Eu não esperava que você realmente viesse.
— Alguém precisa controlar esses idiotas, Runcorn. Não apenas os alunos.
Runcorn riu, claramente alheio à antipatia de Severus.
— Eu não estou vendo o seu par, Severus. Ela desistiu?
— Não é da sua conta, Runcorn.
— Ela vai aparecer logo, eu tenho certeza. — Ele balançou a mão com um sorriso forçado. — E então, você já viu Heather? Eu vou pedir uma dança esta noite, e quem sabe eu tenha mais sorte mais tarde, hein?
Severus apertou os punhos, o ódio subindo rapidamente pela sua espinha.
Finalmente, a porta do Salão Principal se abriu com um suave rangido e Potter entrou com confiança. Seu vestido vermelho contrastava com a luz suave das velas que iluminavam o ambiente, enquanto o seu cabelo estava solto, disposto em longos e largos cachos pelas costas.
Seus olhos procuraram rapidamente por um rosto familiar, e quando os encontrou, o sorriso se alargou. Ela, no entanto, se dirigiu diretamente para Neville Longbottom, que a recebeu com um abraço caloroso. Potter imediatamente puxou a mão dele, já se movendo na direção da pista de dança com uma risada descontraída.
— Nossa… — Runcorn assobiou ao lado de Severus. — Ela está gostosa, não é?
Severus endureceu a expressão e se afastou ligeiramente de Runcorn, tentando não mostrar o quanto estas palavras o incomodavam. Ele decidiu se isolar ainda mais em um canto escondido do Salão, observando Potter se mover pela pista de dança com Longbottom, depois Hagrid e até alguns alunos corajosos.
No entanto, quando a música mudou para uma valsa lenta e Runcorn começou a se aproximar de Potter, Severus não aguentou mais.
Ele atravessou o salão, ignorando as expressões surpresas ao seu redor.
— Com licença, Potter, mas creio que essa dança seja minha.
Heather soltou uma risadinha divertida e, sem hesitar, colocou a mão na de Severus, deixando Runcorn boquiaberto.
— Você finalmente resolveu agir? — Ela provocou, enquanto giravam pela pista.
— Não sei do que você está falando.
— Claro que não. — Heather sorriu. — Não foi você que decidiu esconder o nosso noivado, pois odiaria ter idiotas se metendo na nossa vida pessoal?
— Eu não sei onde estava com a cabeça. — Ele murmurou.
Heather soltou uma risada alta, que fez várias cabeças girarem na direção deles com olhos arregalados.
— Oh, Severus… — Ela continuou. — Você sabe que eu não tenho vergonha de você, amor. E todo mundo já sabia, não há segredo nenhum.
— Eu… — Ele começou, mas não conseguiu continuar, já que algo estava errado nessa declaração. — Você armou isso tudo com a Minerva, não foi?
— Eu não sei o que você quer dizer, meu querido noivo. — Ela depositou a mão em seu peito, fazendo Severus sentir um arrepio na nuca. — E não se preocupe, ninguém, além de Marcus, caiu realmente nessa nossa farsa.
Com um suspiro derrotado, ele olhou para ela, que estava quase rindo da sua expressão exasperada.
— Eu realmente sou um tolo, não é?
— Só um pouquinho. — Heather respondeu com um sorriso encantador. — Mas eu ainda amo você.
— Você vai ser a minha perdição, Heather. — Ele resmungou, e ela apenas sorriu mais amplamente. — E eu também amo você.
— Que bom. Por um momento, eu realmente achei que você traria outro par para o baile.
— Eu só tenho olhos para você, querida.
E então, Severus puxou Heather pela cintura e a beijou, ignorando os suspiros coletivos e o som de cristais caindo de uma bandeja em algum lugar.