
Setembro, 1994
Setembro, 1994
Já estava começando a se acostumar com a falta de noção dos amigos. Harry e Ron eram tão sensíveis quanto um pedaço de madeira!
Não podia acreditar que eles estavam gostando de ser paparicados pelos Elfos Domésticos.
Aquilo beirava à escravidão!
Os elfos corriam por todos os lados da grande cozinha, colocando alimentos nas quatro enormes mesas que ali estavam, imitando as mesas do salão.
Haviam, pelo menos, uns cem elfos.
Sabia que era da natureza dos elfos querer ajudar, mas não se sentia confortável com aquela situação. Eles só não reclamam porque não sabiam o que era viver em condições melhores.
Já estava pensando em como poderia fazer para que todos os elfos começassem a, no mínimo, ter duas folgas por semana, quando voltou a prestar atenção na conversa dos amigos.
- Mas você pode dizer o que quiser sobre os Malfoy agora? - perguntou Harry sorrindo.
Um olhar de temor surgiu nos olhos imensos de Dobby.
- Dobby... Dobby poderia? - disse cheio de dúvida. Aprumou então seus ombrinhos. - Dobby poderia dizer a Harry Potter que seus antigos amos eram... eram... bruxos malvados das trevas!
Dobby ficou parado um instante, o corpo todo tremendo, horrorizado com a sua própria coragem - então correu até a mesa mais próxima e começou a bater a cabeça nela, com força, guinchando:
- Dobby mau! Dobby mau!
Hermione fez menção de ir até a pequena criatura, mas o amigo foi mais rápido. Harry agarrou o elfo por trás da gravata e afastou-o da mesa.
- Obrigado, Harry Potter, obrigado - disse Dobby sem fôlego, esfregando a cabeça.
- Você só precisa de um pouco de prática - disse Harry.
- Prática! - guinchou Winky furiosa. - Você devia ter vergonha, Dobby, falando desse jeito dos seus amos!
- Eles não são mais meus amos, Winky! - disse Dobby em tom de desafio. - Dobby não se importa mais com o que eles pensam.
Os garotos não demoraram. Harry estava inquieto, pensando nas tarefas do torneio tribruxo. Também não fizeram questão de ficar com ela quando ela disse que queria conversar mais um pouco com Dobby e Winky.
Quase ninguém tinha paciência de falar com os elfos. E Dobby não conseguia parar de falar quando começava.
- Como eles eram, Dobby? - perguntou, sabendo que Winky ainda ouvia. - Como pessoa. Lucius Malfoy parece ser um homem muito importante… - mentiu, genuinamente curiosa.
- Sim! O senhor Malfoy é um homem muito importante no Ministério da Magia. Dobby fazia questão de passar todos os seus ternos, todos os dias. O senhor Malfoy gosta de tudo perfeito. - falava, com sua vozinha estridente - Dobby nunca era elogiado, mas quando aprendeu a fazer as coisas do jeito que o mestre gostava, parou de apanhar! - disse, como se fosse algo extraordinário. - Passou a só se castigar. Mestre Lucius não tinha mais tempo para bater em Dobby e o Sr. Draco não gostava de encostar em Dobby.
Sentiu um frio da espinha. Se achava que Draco era ruim, não gostava nem de pensar na crueldade que Lucius Malfoy tinha dentro de si.
- Então Draco nunca bateu em você?
- Não! O mestrinho só mandava Dobby bater a cabeça na parede. - disse, como se não fosse nada. - Quando era bebê ele achava engraçado. Quando ficou maior, parou de falar com Dobby. - completou, com uma certa tristeza. - Só falava quando estava triste.
Malfoy não falava com ela desde o soco.
Não diretamente.
Ele irritava Harry, principalmente por conta do torneio, mas nunca falava diretamente com ela.
Parou para pensar, por um segundo, em como Dobby ficou sabendo sobre a possível abertura da câmara secreta no segundo ano…
Devia ter ouvido Lucius falar, pensando que o elfo não faria nada. Mas, se os elfos acreditam fielmente em seus amos, só havia um motivo para Dobby saber sobre Harry: Draco deve ter falado sobre ele.
- Trabalhou lá por muito tempo, não é mesmo, Dobby?
- Sim! Meu primeiro amo foi o senhor Abraxas! Pai do mestre Lucius. - divagava, ainda usando termos de respeito. Fazia parte da sua criação como elfo. - A mãe de Dobby trabalhava com a Sra. Malfoy, Catherine Selwyn, antes mesmo dela se casar com o antigo senhor Malfoy.
Os Selwyn eram uma antiga família sangue puro inglesa. Provando mais uma vez a ancestralidade de Draco Malfoy.
- Quando o mestre Lucius se casou, a mãe de Dobby virou serva da Sra. Narcissa Malfoy.
- Sua mãe ainda está lá? - perguntou preocupada. Tinham que dar um jeito de tirar a mãe do amigo de lá!
- Não, Srta. Granger! A mãe de Dobby morreu há muito tempo. De tristeza. - interrompeu Winky. - A Sra. Narcissa é uma mulher muito triste. Não gosta de sair, não gosta de comer. Não gosta de nada. E de quê serve um elfo, sem um amo para agradar? - questionou, de forma a alfinetar Hermione.
Lembrou de uma das poucas vezes em que avistou a mulher. Na copa mundial de quadribol, no início do ano, junto ao cônjuge e ao filho.
Ela realmente parecia triste. Deprimida, até. Só lembrou de vê-la sorrir uma vez, quando veio assistir o jogo de quadribol da Sonserina no segundo ano. Pelo menos sorria enquanto o time do filho ganhava a partida, não conseguia imaginar as maldades que Lucius deve ter falado ao filho quando o mesmo perdeu o jogo para Harry Potter.
Lembrou das teorias de Harry, de que Lucius era comensal da morte.
Chacoalhou a cabeça, tentando afastar o pensamento. Sabia que os Malfoy eram preconceituosos, mas não a este ponto. Se Lucius fosse um comensal, teria sido preso, assim como Igor Karkaroff, na guerra que encerrou há 14 anos atrás.
Hermione respirou fundo. Não devia empatia ao Draco Malfoy. Mas crescer com um pai cruel e uma mãe apática não parecia nada saudável. Talvez, e só talvez, as maldades que Draco fazia para agradar o pai começassem a fazer sentido em sua mente.
Se despediu dos elfos, saindo sorrateiramente por trás do quadro que guardava a cozinha da escola.
Se sentindo mal por Malfoy ser… um Malfoy.
We can't be friends
But I'd like to just pretend
You cling to your papers and pens
Wait until you like me again