
Jay estava nervoso.
A sua gravata ainda não parecia perfeita, mesmo após três tentativas frustradas de dar um nó. O terno parecia impecável, embora Jay pensasse que talvez poderia ter sido passado mais uma vez. Os sapatos estavam limpos e bem lustrados, mas ainda havia essa sensação incômoda no fundo de sua mente de que faltava alguma coisa.
Ele puxou as mangas do paletó desajeitadamente, ajeitou os ombros e tentou se convencer de que estava pronto, de que havia alguma confiança ali.
— É só um encontro. Você já fez isso antes. — Murmurou para o espelho.
Sim, ele já fez.
Há mais de 30 anos.
Antes dos aplicativos de namoros, das redes sociais e dos emojis. Antes de precisar se preocupar com a diferença de “dois cliques” e “clique duplo” ou qual era o tom certo de mandar um “haha” na conversa sem parecer forçado ou sarcástico.
Então, na verdade, talvez ele nunca tivesse feito isso de verdade .
Naquela época, as mulheres eram recatadas e submissas, os homens eram expansivos e autocentrados. Se ele for parar pra pensar, ele nunca precisou se esforçar muito.
Mas agora os tempos eram outros. Como ele, um homem na casa dos 50, seria capaz de encantar uma mulher 20 anos mais nova do que ele?
Uma mulher tão linda, doce e inteligente… E, com sorte, ela também seria paciente o suficiente para lidar com um velho como ele.
Jay respirou fundo, tentando acalmar o enxame de abelhas que parecia ter tomado seu estômago. Ele olhou pela janela e sentiu o corpo ficar ainda mais tenso quando um raio iluminou o céu, seguindo por um trovão.
Sério? Uma tempestade logo hoje?
Jay pegou o guarda-chuva e a chave do carro, e respirou mais uma vez antes de abrir a porta e sair, determinado a ignorar o mau tempo.
Lá fora, o vento gelado e as primeiras gotas de chuva o atingiram em cheio, forçando-o a apertar os dentes enquanto lutava para se manter de pé. Ele avançou com pressa, desviando das poças que começaram a se formar no caminho.
No último segundo, não conseguiu evitar uma delas. Pisou diretamente nela, sentindo a água gelada invadir seu sapato esquerdo.
— Porra. — Resmungou, balançando a perna em um esforço inútil, enquanto tentava entrar no carro pulando em um pé só.
Finalmente, se acomodou no banco do motorista, a sensação da meia molhada contra a pele o incomodando. Por um breve momento, ficou apenas ali sentado, encarando a chuva que tamborilava sobre o capô do carro.
Jay ficou tentado a simplesmente dar meia volta e voltar para dentro de casa.
No instante seguinte, ele se sentiu envergonhado.
Parecia apenas uma desculpa patética para evitar esse encontro, evitar se esforçar por uma mulher que ele realmente gostava, evitar dar um passo adiante e seguir em frente.
Era mais fácil continuar na zona de conforto, onde nada exigia mais do que as velhas rotinas.
Jay poderia ser um velho chato, antiquado, viciado em trabalho e até um pouco mandão.
Mas ele não era um covarde.
Ele ligou o carro e finalmente saiu da garagem.
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Jay havia investido uma boa quantia de dinheiro para garantir uma mesa no melhor restaurante de Los Angeles. O local era intimista e romântico, localizado em um terraço, com uma vista deslumbrante de West Hollywood.
O que seria bem irrelevante, já que estava caindo uma tempestade naquele dia.
E se não bastasse a chuva para atrapalhar os seus planos, Jay também estava atrasado.
Mais de 40 minutos depois do horário combinado, ele conseguiu estacionar no restaurante e correr para dentro — a água da chuva espirrando para todo lado e a meia molhada ainda desconfortável dentro do seu sapato —, torcendo para que Heather não tivesse desistido dele.
E, francamente, se ela tivesse feito isso, ele não a culparia.
No entanto, isso não aconteceu. Ela estava lá.
Jay exalou o ar preso em seus pulmões assim que a viu.
Ele sabia que ela era perfeita, mas sempre ficava com a mente em branco sempre que a via.
Heather estava sentada em uma das mesas perto das grandes janelas, os olhos fixos na chuva que caía lá fora, seus longos cachos ruivos caiam artisticamente sobre seu ombro direito, escondendo parcialmente seu lindo rosto. Havia uma taça de vinho delicadamente equilibrada entre os seus dedos finos, e ela bebia calmamente, os lábios vermelhos fazendo um biquinho adorável sempre que ela erguia a taça.
Jay sentiu o coração acelerar, o peito apertando em uma mistura de ansiedade, medo e antecipação, enquanto aproximava-se sem desviar o olhar.
— Parece que virou uma coisa nossa nos encontrarmos em dias de chuva.
Heather olhou para cima, os olhos verdes iluminando-se imediatamente ao vê-lo. Jay pode ter ficado um pouco presunçoso por isso.
— Eu achei que você tinha ficado com medo da chuva.
— Me desculpe pelo atraso. — O rosto de Jay caiu, desconcertado. — Eu… eu não esperava que fosse chover tanto logo hoje.
— Está tudo bem, Jay. — Heather abriu um sorriso deslumbrante. — Eu também não cheguei no horário exato. Por favor, sente-se.
Jay se acomodou na cadeira, com as mãos um pouco trêmulas. O silêncio que se seguiu foi desconfortável.
O que ele deveria dizer neste momento? Havia algum protocolo adequado para isso? Alguma saudação que os jovens usam durante os encontros?
— É ótimo ver você. — Finalmente ele decidiu.
— Também é ótimo ver você.
Jay riu, sem jeito, e olhou para baixo, tentando encontrar algo para fazer com as mãos.
Ele deveria deixar as mãos na mesa? Ou no colo? Ele deveria segurar algo?
Merda, ele deveria ter trazido alguma coisa? Chocolate? Joias? Flores, talvez?
— Me desculpe, eu me sinto tão bobo. Faz muitos anos que eu não tenho um encontro. — Ele soltou, rindo nervosamente.
— Eu sei. Faz tempo pra mim também. — Ela bufou. — Eu passei horas apenas tentando decidir o que vestir.
Jay finalmente notou a roupa dela. Ela parecia deslumbrante. Um vestido justo, preto e de gola alta que a fazia parecer elegante e sexy de uma forma que fez o rosto dele esquentar.
Ele desviou o olhar novamente. Era normal se sentir tão envergonhado?
Sem pensar muito, ele murmurou:
— Você está linda.
— Você também. — Heather abriu um sorriso tímido, as bochechas ficando rosadas e a deixando ainda mais adorável. O que Jay achava que era impossível. — Eu estou feliz pelo seu convite. Eu não esperava nada disso quando vim aos EUA, mas foi uma surpresa boa.
— Eu estou feliz que você veio.
Eles sorriam um para o outro, e o mundo ao redor pareceu desaparecer.
Foram apenas alguns segundos, mas poderiam ter sido anos — uma eternidade suspensa entre olhares que diziam mais do que qualquer palavra.
Havia algo encantador sempre que os olhos amendoados dela se estreitavam quando se fixavam nele, como se ela fosse capaz de sorrir com eles; ou sempre que os dele, num tom quente de castanho, brilhavam como se enxergassem algo precioso demais para desviar o olhar.
Havia uma promessa de algo entre eles. Um segredo compartilhado. Um desejo profundo e insistente.
Algo que não precisava ser dito no silêncio de olhares trocados.
E então, o feitiço foi quebrado.
— Vocês estão prontos para pedir, senhores? — A voz do garçom cortou o silêncio.
Jay negaria até a morte que pulou na cadeira de susto, fazendo-a balançar perigosamente para a esquerda.
Heather olhou para ele, os olhos brilhando de diversão, os lábios comprimidos tentando segurar uma risada borbulhante.
— Eu não estava esperando. — Ele sussurrou para ela, tentando se recompor. — Mas, sim, estamos prontos.
O garçom ignorou-os solenemente, assentiu com um sorriso educado e começou a anotar os pedidos sem perder o ritmo.
Quando ele saiu, Heather caiu sobre a mesa com uma gargalhada explosiva.
— Me desculpe. — Ela arfou, recuperando o fôlego. — Eu achei que você fosse cair da cadeira. O que foi isso?
— Eu estava distraído.
— Meu Deus, Jay, você parecia que ia desmaiar.
— Nunca fui bom com surpresas.
— Terei cuidado em chegar perto de você a partir de hoje.
— Bobagem! Foi apenas uma pequena distração, reflexos enferrujados.
— Claro que sim.
Ela sorriu ainda mais, claramente divertida. Jay não pôde deixar de abrir um sorriso igualmente brilhante.
Estava tudo perfeito.
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Jay pode ter decidido que tudo estava perfeito um pouco cedo demais.
Não que as coisas tivessem desmoronado completamente — ainda. Mas, se ele fosse do tipo supersticioso, já estaria correndo para longe.
Vamos aos fatos primeiro: Jay queria se exibir para Heather.
Então, num surto de desespero romântico, ele escolheu a garrafa de vinho mais cara do restaurante. Ele mal olhou para o cardápio. Só viu um preço astronômico, algo sobre ser francês e seco, e decidiu que era perfeito.
Quando o garçom trouxe o vinho para a mesa, Jay poderia deixá-lo servir como qualquer pessoa normal e sensata.
Jay não era normal (ou sensato), no entanto.
Então, quando o garçom chegou com a garrafa, em vez de deixar o profissional fazer seu trabalho, Jay sorriu e tomou o abridor das mãos do pobre garçom.
E foi assim que, em menos de cinco segundos, novecentos dólares viraram uma poça luxuosa de vinho francês no chão do restaurante.
Heather piscou, primeiro para a garrafa estilhaçada, depois para Jay.
Depois ela gargalhou.
As coisas começaram um pouco fora do habitual, mas o encontro ainda poderia melhorar, certo?
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Bem… não melhorou…
— O que é isso?
— Foi o que você pediu, não foi?
— Mas era pra ser tão… grande assim?
— Sim… claro?
— Eu não sei se consigo lidar com isso.
— Você só precisa de um pouco de força. E abrir bem a boca.
— Só? Você está vendo o tamanho disso? É demais pra mim!
— Ah, vamos lá, não é tão difícil.
— Olha o tamanho das minhas mãos. Eu nem sei por onde começar, ou como segurar.
— Bem, talvez se você começar pelas extremidades?
— Vocês, americanos, têm uma fixação por coisas grandes, né?
— Pelo menos nós não assassinamos o feijão no café da manhã.
— Isso vindo de alguém que mora em um país que considera queijo em spray aceitável.
— Pelo menos não achamos que três ervilhas, batatas murchas e um pedaço de peixe encharcado de óleo são uma refeição completa.
— Isso foi pessoal.
— Talvez um pouco.
— …
— …
— Não acho que nada disso vai me ajudar agora…
— Ajudaria se eu pedisse um chá com leite para acompanhar?
— Agora você está sendo um pouco culturalmente insensível… No entanto , isso pelo menos ajudaria esta pobre criatura a ter alguma dignidade.
— … Você está chamando essa lagosta de pobre criatura ?
— Você já olhou nos olhos dela? Ela está me julgando.
— Você está inventando desculpas para não ter que abri-la.
— Talvez.
— Me dê isso aqui.
— Com delicadeza, por favor. Respeite os mortos.
Dez minutos depois, eles assistiram em câmera lenta um pedaço de lagosta voar pelo ar e pousar exatamente no topo da careca brilhante de um senhor da mesa ao lado.
Silêncio.
— Vou fingir que isso não aconteceu.
— Ótima ideia.
Eles tiveram que se concentrar bastante para não cair na gargalhada.
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A noite ainda não estava completamente arruinada, no entanto.
Jay pediu outra garrafa de vinho, dessa vez deixando o garçom abrir. Ele decidiu que ainda tinha tempo para salvar pelo menos parte do encontro, deixá-lo pelo menos com um final romântico.
Então, começou a contar uma história.
Bem… talvez tenha sido boa demais .
Isso foi o suficiente para Heather explodir em uma gargalhada repentina e incontrolável, exatamente no momento errado. O vinho tomou um desvio inesperado quando ela sugou o ar e, em vez de descer pela garganta, espirrou pelo nariz.
Ela se engasgou, tossiu, e, antes que pudesse processar, um jato fino de vinho voou pelo ar e aterrissou direto na toalha branca da mesa.
Jay arregalou os olhos, depois olhou para Heather, que agora tentava desesperadamente recuperar o fôlego enquanto piscava furiosamente.
— … Você espirrou um Merlot?
Heather bateu a mão na mesa, ainda tossindo de tanto rir. Algumas cabeças viraram em sua direção, olhares curiosos e narizes franzidos em desdém, enquanto as pessoas chiques os julgavam pela falta de decoro.
— Pelo nariz, Jay. — Ela conseguiu dizer entre tosses e risos. — Eu acabei de atingir um nível de humilhação que eu nem sabia que era possível.
— Será que eles vão nos expulsar agora?
— Não é com isso que eu estou preocupada… as pessoas estão nos encarando…
— Será que se você fingir um desmaio, vai funcionar?
— Só se você gritar: “Oh Deus, ela foi envenenada”.
Jay soltou uma gargalhada, atraindo ainda mais atenção.
— Você é uma britânica terrível. Eu sempre achei que vocês fossem todos elegantes, cheios de classe, bebendo vinhos caros em taças importadas…
— … Acho que já passei tempo demais na América.
Ele sorriu, erguendo a taça.
— Então, um brinde a isso.
Ela pegou a própria taça, embora levemente hesitante.
— Só me deixe engolir primeiro, pelo amor de Deus.
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— Eu vou pedir que os senhores se retirem do restaurante, por favor.
— …
— …
— …
— Estamos sendo expulsos? — Heather sussurrou.
— Parece que sim… Calma, eu vou resolver. — Jay respondeu em um tom baixo. — Oh Deus! Ela foi envenenada.
Apenas Jay e Heather estavam rindo.
Eles foram expulsos.
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Para a sorte deles ainda estava chovendo, e o manobrista estava demorando demais para trazer o carro.
Eles estavam em silêncio.
Quando a graça da situação se encerrou, Jay se sentiu bastante constrangido por não ter conseguido capturar a atenção de Heather e fazer com que ela se apaixonasse por ele naquela noite.
— Heather… me desculpe por esta noite… — Sua voz estava cheia de arrependimento.
— Jay… esse foi o pior encontro que eu já tive.
As palavras dela foram como um golpe direto no coração dele. Claro que sim, ele estragou tudo.
— Mas eu nunca me diverti tanto. Pode ter sido um desastre, mas foi incrível. Se isso fosse apenas sobre palavras chiques e gestos desnecessariamente caros, acredite em mim, eu teria continuado casada com o meu ex-marido. Mas foi como você… doce, gentil e engraçado. Eu não poderia ter feito melhor.
Jay não conseguiu evitar uma risada nervosa, um arrepio subindo pela sua nuca e fazendo sua garganta apertar.
— Bem, você sabe como aplacar as inseguranças de um homem. — Jay respirou fundo, sentindo o coração acelerar. Uma onda de esperança se infiltrando dentro de seu peito, apertando o pulmão contra as costelas de um jeito doce e doloroso. — Eu queria ter feito mais, mas fico feliz que você tenha gostado. Foi terrível, mas ainda foi divertido no final… E, bem, só foi divertido, porque era com você. Você tornou tudo melhor.
Ele estendeu a mão aberta, os dedos trêmulos e ansiosos, querendo tocá-la. Heather olhou para sua mão por um instante, e então, suavemente, depositou a dela sobre a dele, a maciez de sua pele fazendo a respiração dele falhar.
Jay entrelaçou os dedos dela nos seus, sentindo a pele macia sob a sua. Ele queria dizer tantas coisas, mas as palavras pareciam presas na garganta. Ele nunca foi um homem de grandes palavras. Jay sempre foi mais do tipo “ações falam mais alto”. Ele não tinha o hábito de declamar poesias ou fazer discursos.
No entanto, mesmo com o silêncio, olhares trocados e mãos entrelaçadas, ele ainda se sentia esperançoso.
E essa esperança era uma coisa engraçada. Enchia o peito e os olhos, fazia a garganta arder, a respiração falhar.
Jay já havia sentido isso antes? Ele não tinha certeza.
Em algum momento no passado, talvez, antes de DeDe ou no início do relacionamento deles, com alguma namoradinha em um dos bailes de escola ou nos breves romances de verão.
Mas nada como isso.
Nada como esse desejo que enchia o peito e o deixava sem fala, apertava a garganta e acelerava o coração. Fazia Jay ter certeza de que, mesmo se pudesse, não haveriam verbos e adjetivos suficientemente capazes de descrever o que ele sentia.
Então, ele apenas apertou a mão dela com força, como se fosse a única coisa que pudesse fazer naquele momento. O que dizer quando se está tão cheio?
Seu polegar acariciou suavemente o topo da mão dela, e algo dentro dele se acalmou.
Eles ficaram assim por alguns segundos. Em um silêncio de palavras não ditas, mas que ambos sabiam profundamente da existência.
Então, Heather, de repente, puxou sua mão num impulso inesperado.
— Vem comigo!
— O quê? Heather!
Ela o puxou em direção ao outro lado da rua, e eles correram, rindo sob a chuva, até chegar em uma praça iluminada pela luz suave dos postes.
O cabelo de Heather estava molhado, seus cachos se soltando com a água, e o terno de Jay estava completamente arruinado, mas nada disso era importante quando ela o olhava daquele jeito, quando ela sorria daquele jeito.
— Essa noite foi perfeita, mas só faltou uma coisa para ser digna de uma comédia romântica.
— O quê?
Ela se aproximou dele, os rostos agora quase se tocando.
— Eu quero que você me beije sob a chuva.
Ela não precisou pedir duas vezes.
Jay a puxou para si com uma urgência inesperada, os dedos firmes na sua cintura, e os lábios deles se encontraram em um beijo apaixonado.
A água escorria sobre as suas peles, o tecido de suas roupas grudavam, pesado e encharcado, enquanto eles se abraçavam com força.
O som da água ao redor era quase como uma melodia suave, mas nada poderia se comparar ao ritmo acelerado de seus corações, batendo juntos no compasso de algo mais forte que qualquer palavra, qualquer explicação.
Jay esperava muitas coisas esta noite.
Ele não esperava ser aquele que havia se apaixonado perdidamente.